Por Mariuza Pregnolato
Por que ficamos, às vezes, atormentados com a dúvida “Será que eu sou normal?”
Porque grande parte dos problemas que atormentam as
nossas vidas são internos, isto é, são dúvidas da vida privada das
pessoas e elas não tem como saber que outras pessoas também podem, em
algum momento da vida, vivê-los igualmente. Por parecerem perigosos, ou
vergonhosos, ou graves demais, ou bobos demais, etc.. elas alimentam a
idéia de que há algo errado com elas, sentindo-se sozinhas naquele
sofrimento que parece controlá-las.
O que é ser normal?
O conceito de normalidade é muito difícil de ser
estabelecido porque envolve contingências sócio-culturais, normativas e
legais, geográficas, quantitativas, familiares, podendo também estar
impregnado de tabus, etc. Por exemplo, em nossa sociedade considera-se
anormal ser excessivamente agressivo, mas um indivíduo que cresceu num
ambiente de muita brutalidade – se ele for ‘normal’, isto é, saudável –
terá que desenvolver bastante sua agressividade por uma questão de
sobrevivência e, por conseguinte, tornar-se-á mais agressivo que a
média das pessoas de nosso convívio.
Se esse indivíduo for analisado
contextualmente, não poderá ser considerado anormal, pois sua adaptação
ocorreu em sintonia com o que aprendeu em seu meio. Portanto, naquele
contexto, ele é normal. A sociedade mais ampla, porém, tenderá a
temê-lo e a rotulá-lo de anormalmente agressivo. Talvez o exemplo que
ilustre melhor essa questão seja o fato de que, durante a segunda
guerra mundial, era normal ser nazista na Alemanha.
Num mundo com tantas tribos, em que existe espaço para cada um ser o que é, ainda é possível haver dúvida sobre o que é ser normal?
Apesar da aparente aceitação da diversidade no
comportamento das pessoas, há atitudes que são consideradas desviantes
e ativam o preconceito existente em alguns grupos de pessoas. Por
exemplo, um rapaz com o corpo e rosto cobertos de tatuagem pode ser um
gênio financeiro e ser recusado num processo de seleção a um cargo a
que ele estaria plenamente apto a ocupar numa instituição financeira
tradicional. Embora seja aceito espontaneamente por sua ‘comunidade de
tatuados’, é apenas tolerado na sociedade em geral e recusado numa
comunidade mais tradicional. Mesmo que ele seja alguém bastante
adequado em todas as outras áreas de sua vida, os grupos
preconceituosos tenderão a associar sua aparência a aspectos negativos
como delinqüência, criminalidade, insubordinação, etc..
O terapeuta pode ajudar a desfazer o conflito de uma pessoa que se acha anormal?
Com certeza! Ele é capaz de ajudar a pessoa a
escolher o caminho ou atitude que irão lhe oferecer a melhor
possibilidade de fazer o que gosta sem ser punido por isso e sem afetar
negativamente a sociedade. No exemplo acima, se o grande sonho desse
rapaz for trabalhar numa grande instituição financeira que tem um
caráter visivelmente conservador, ele precisará considerar que tatuar
todo o seu corpo provavelmente o impedirá de realizar esse sonho. Não
adianta ele gritar, a plenos pulmões, que é livre para fazer o que
quiser com seu corpo e rosto, se vai frustrar-se com as limitações que
esse procedimento lhe trouxer no futuro.
No momento em que está tomada por suas emoções e
desejos, é comum que a pessoa aja impulsivamente, adotando atitudes que
podem trazer duras conseqüências no futuro. É com esse tipo de
reflexão que o terapeuta pode ajudar a pessoa a proteger-se de
sofrimentos futuros, já que o ser humano tende, em geral, a enxergar
somente a gratificação mais imediata.
O imediatismo pode transformar-se
em auto-sabotagem e esse mecanismo precisa ser compreendido e
substituído por outro mais eficiente. Caso ele já esteja sofrendo a
conseqüência de um ato impensado, o trabalho terapêutico o ajudará a
lidar com as frustrações decorrentes de seus atos e a enxergar e abrir
novos caminhos que sejam condizentes com a sua condição atual.
Normalidade passa pelo critério de auto-aceitação?
Também, mas passa, principalmente, pelo critério da
reflexão e análise profunda, em que todo o contexto precisa ser
considerado amplamente, para que se decida se um determinado indivíduo
ou situação pode ser considerado anormal em relação às várias contingências que o geraram e o mantém.
Quem se perturba mais com dúvidas sobre a questão da normalidade: homens ou mulheres?
Ambos. As mulheres costumam apresentar maior
facilidade para buscar ajuda diante de situações difíceis, daí porque
tende a parecer que elas têm mais problemas e dúvidas. Na verdade,
nossa sociedade ainda é machista, de modo que, ao mesmo tempo em que
privilegia o homem em algumas questões, por outro lado ainda cobra dele
uma postura de forte, capaz, racional, resolvido, etc., o que inibe
sua disposição para mostrar suas fragilidades e dúvidas. Para não
parecer um “fracote”, ele abre mão de buscar ajuda para suas
fraquezas, fingindo e tentando aparentar uma fortaleza que, na maioria
das vezes, não possui.
O medo de não ser normal impede as pessoas de iniciarem seu processo terapêutico?
Isso ocorre, mas o mais comum é que essa dúvida
seja mais um motivo para levá-las à terapia do que para impedi-las É
tão grande o alívio que se obtém ao descobrir que o drama interno que
está sendo vivido não é tão grave assim, que as pessoas, em geral,
lamentam não ter dado esse passo antes. Na terapia, elas aprendem a
relativizar a importância dos fatores que as fazem sofrer e a resolver
questões que, anteriormente, pareciam insolúveis.
Por que uma pessoa que se sente normal faria terapia se ainda há preconceito em procurar um psicólogo?
Penso que o fato de existirem tantas pessoas
bem-sucedidas, bem resolvidas e inteligentes que fazem terapia e a
valorizam, tem feito com que muito preconceito tenha caído no vazio. No
entanto, fazer terapia é um passo que deve ser dado por cada um
individualmente, quando sentir que está pronto para buscar ajuda. Isso
irá ocorrer no momento em que a pessoa decidir que deseja tomar a sua
vida nas próprias mãos, ao invés de continuar prestando contas a
opiniões de terceiros.
O terapeuta nunca irá interferir na vida da
pessoa de modo direto, nem nunca decidirá nada por ele. Será um
coadjuvante do seu desenvolvimento pessoal e o analisando tornar-se-á
uma pessoa mais inteira, mais livre das armadilhas sociais, mais
autônomo e dono de sua própria vida.
Meus problemas parecem tão insignificantes,
que tenho vergonha de admitir que sofro tanto por coisas tão bobas.
Isso é normal?
Questões aparentemente insignificantes ou pueris
são, às vezes, responsáveis por altas doses e longos períodos de
sofrimento. Às vezes a pessoa acha que seu problema é tão pequeno, que
não tem coragem de contá-lo a ninguém. O que é preciso que se
compreenda é que nada é bobinho ou insignificante, se for capaz
de trazer sofrimento. Por essa razão, sempre merecerá ser tratado. Da
mesma forma, a pessoa que não se sente normal, e sofre com isso, deve
buscar ajuda para compreender o que está ocorrendo e poder voltar a se
sentir feliz.
FONTE: http://www.mariuzapregnolato.com.br/?cont=faq_sobre_o_que_e_ser_normal
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