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quinta-feira, 31 de maio de 2012

Ansiedade, Estresse e Esgotamento


Ansiedade, Estresse e Esgotamento são termos de uso corrente entre as pessoas participantes daquilo que se chama vida moderna. Ninguém gosta de pensar na Ansiedade, no Estresse, no Esgotamento ou na Depressão como sendo formas de algum transtorno mental, é claro. Isso pode parecer muito próximo do descontrole, da piração ou da loucura e, diante da possibilidade de sermos afetados, pelo menos alguma vez na vida, pelo Estresse, pelo Esgotamento ou pela Depressão, então será melhor não considerá-los como formas de algum transtorno emocional.
Devemos considerar o Estresse uma ocorrência fisiológica e normal no reino animal. O Estresse é a atitude biológica necessária para a adaptação do organismo à uma nova situação. Em medicina entende-se o Estresse como uma ocorrência fisiológica global, tanto do ponto de vista físico quanto do ponto de vista emocional. As primeiras pesquisas médicas sobre o Estresse estudaram toda uma constelação de alterações orgânicas produzidas no organismo diante de uma situação de agressão.
Fisicamente o Estresse aparece quando o organismo é submetido à uma nova situação, como uma cirurgia ou uma infecção, por exemplo, ou, do ponto de vista psicoemocional, quando há uma situação percebida como de ameaça.
De qualquer forma, trata-se de um organismo submetido à uma situação nova (física ou psíquica), pela qual ele terá de lutar e adaptar-se, conseqüentemente, terá de superar. Portanto, o Estresse é um mecanismo indispensável para a manutenção da adaptação à vida, indispensável pois, à sobrevivência.
Do ponto de vista psíquico o Estresse se traduz na Ansiedade. A Ansiedade é, assim, uma atitude fisiológica (normal) responsável pela adaptação do organismo às situações de perigo. Vejamos, por exemplo, as mudanças acontecidas em nossa performance física quando um cachorro feroz tenta nos atacar, quando fugimos de um incêndio, quando passamos apuros no trânsito, quando tentam nos agredir e assim por diante.
De frente para o perigo nossa performance física faz coisas extraordinárias, coisas que normalmente não seríamos capazes de fazer em situações mais calmas. Se não existisse esse mecanismo que nos coloca em posição de alerta ou alarme, talvez nossa espécie nem teria sobrevivido às adversidades encontradas pelos nossos ancestrais.Embora a Ansiedade favoreça a performance e a adaptação, ela o faz somente até certo ponto, até que nosso organismo atinja um máximo de eficiência.
À partir de um ponto excedente a Ansiedade, ao invés de contribuir para a adaptação, concorrerá exatamente para o contrário, ou seja, para a falência da capacidade adaptativa. Nesse ponto crítico, onde a Ansiedade foi tanta que já não favorece a adaptação, ocorre o esgotamento da capacidade adaptativa. Vejamos ao lado, a ilustração de um gráfico hipotético, onde teríamos um aumento da adaptação proporcional ao aumento da Ansiedade até um ponto máximo, com plena capacidade adaptativa. A partir desse ponto o desempenho ou adaptação cai vertiginosamente. Aí se caracteriza o Esgotamento.
Em nossos ancestrais esse mecanismo foi destinado à sobrevivência diante dos perigos concretos e próprios da luta pela vida, como foi o caso das ameaças de animais ferozes, das guerras tribais, das intempéries climáticas, da busca pelo alimento, da luta pelo espaço geográfico, etc.
No ser humano moderno, apesar dessas ameaças concretas não mais existirem em sua plenitude tal como existiram outrora, esse equipamento biológico continuou existindo. Apesar dos perigos primitivos e concretos não existirem mais com a mesma freqüência, persistiu em nossa natureza a capacidade de reagirmos ansiosamente diante das ameaças.
Com a civilidade do ser humano outros perigos apareceram e ocuparam o lugar daqueles que estressavam nossos ancestrais arqueológicos. Hoje em dia tememos a competitividade social, a segurança social, a competência profissional, a sobrevivência econômica, as perspectivas futuras e mais uma infinidade de ameaças abstratas e reais, enfim, tudo isso passou a ter o mesmo significado de ameaça e de perigo que as questões de pura sobrevivência à vida animal ameaçavam nossos ancestrais. Se na antigüidade tais ameaças eram concretas e a pessoa tinha um determinado objeto real à combater (fugir ou atacar), localizável no tempo e no espaço, hoje em dia esse objeto de perigo vive dentro de nós. As ameaças vivem, dormem e acordam conosco.
Se, em épocas primitivas o coração palpitava, a respiração ofegava e a pele transpirava diante de um animal feroz a nos atacar, se ficávamos estressados diante da invasão de uma tribo inimiga, hoje em dia nosso coração bate mais forte diante do desemprego, dos preços altos, das dificuldades para educação dos filhos, das perspectivas de um futuro sombrio, dos muitos compromissos econômicos cotidianos e assim por diante. Como se vê, hoje nossa Ansiedade é continuada e crônica. Se a adrenalina antes aumentava só de vez em quando, hoje ela está aumentada quase diariamente.
A Ansiedade aparece em nossa vida como um sentimento de apreensão, uma sensação de que algo está para acontecer, ela representa um contínuo estado de alerta e uma constante pressa em terminar as coisas que ainda nem começamos. Desse jeito nosso domingo têm uma apreensão de segunda-feira e a pessoa antes de dormir já pensa em tudo que terá de fazer quando o dia amanhecer. É a corrida para não deixar nada para trás, além de nossos concorrentes. É um estado de alarme contínuo e uma prontidão para o que der e vier.
As férias são tranqüilas e festivas apenas nos primeiros dias mas, logo em seguida, começamos a nos agitar: ou porque sentimos que não estamos fazendo alguma coisa que deveríamos fazer, embora não saibamos bem o que, ou porque pensamos em tudo aquilo que teremos de fazer quando as férias terminarem.
A natureza foi generosa oferecendo-nos a atitude da Ansiedade ou Estresse, no sentido de favorecer sempre a adaptação. Porém, não havendo período suficiente para a recuperação desse esforço psíquico, o qual restabeleceria a saúde, ou persistindo continuadamente os estímulos de ameaça que desencadeiam a reação de Estresse, nossos recursos para a adaptação acabam por esgotar-se. O Esgotamento é, como diz o próprio nome, um estado onde nossas reservas de recursos para a adaptação se acabam.
Organicamente, no Esgotamento, há alterações significativas nas glândulas supra-renais (produtoras de de adrenalina e cortisona), há dificuldades no controle da pressão arterial, há alterações do ritmo cardíaco, alterações no sistema imunológico, no controle dos níveis de glicose do sangue, entre muitas outras. Psiquicamente a Ansiedade crônica ou Esgotamento leva à um estado de apatia, desinteresse, desânimo e de pessimismo em relação à vida.
Os sintomas mais comuns da ansiedade podem ser listados como abaixo e, normalmente costumam estar relacionados à estresse ambiental crônico, têm um curso flutuante, variável e tendência à cronificação.

SINTOMAS ASSOCIADOS À ANSIEDADE CRÔNICA
01 - tremores ou sensação de fraqueza
02 - tensão ou dor muscular
03 - inquietação
04 - fadiga fácil
05 - falta de ar ou sensação de fôlego curto
06 - palpitações
07 - sudorese, mãos frias e úmidas
08 - boca seca
09 - vertigens e tonturas
10 - náuseas e diarréia
11 - rubor ou calafrios
12 - polaciúria (aumento de número de urinadas)
13 - bolo na garganta
14 - impaciência
15 - resposta exagerada à surpresa
16 - dificuldade de concentração ou memória prejudicada
17 - dificuldade em conciliar e manter o sono
18 - irritabilidade
O Esgotamento tem origem em duas ocasiões:
1. - Primeiro, quando a situação à qual o indivíduo terá que adaptar-se (estímulo externo ou interno) exigir intensa participação emocional e persistir continuadamente. Nesse caso há um esgotamento por falência adaptativa devido aos esforços (emocionais) para superar uma situação persistente. Isso quer dizer que o estímulo para o estresse seria ameaçador tanto para a pessoa que à ele reage, quanto para outras pessoas submetidas ao mesmo estímulo.
2. - Em segundo lugar, quando a pessoa não dispõe de uma estabilidade emocional suficientemente adequada para adaptar-se à estímulos não tão traumáticos, objetivamente falando. Isso quer dizer que a pessoa sucumbiria emocionalmente à situações não tão agressivas à outras pessoas colocados na mesma situação mas, não obstante, agressivas particularmente à ela.
Digamos, então, que o esgotamento ou a ansiedade crônica e patológica poderia surgir diante de duas circunstâncias: decorrente daquilo que o mundo traz à pessoa (Agentes Ocasionais) ou, por outro lado, decorrente daquilo que a pessoa traz ao mundo (Disposições Pessoais). A primeira representada pelo destino da pessoa e a segunda pelo seu perfil afetivo. Não obstante, o destino poderá modelar determinadas formas de valorizar a realidade em grande número de pessoas
Estímulos que Produzem Ansiedade e, conseqüentemente, EstresseSe hoje sabemos muito sobre o Estresse e a Ansiedade, tanto do ponto de vista comportamental quanto neuroquímico, pouco sabemos ainda sobre seu aspecto principal ou primordial. Pouco sabemos sobre esse tal estímulo desencadeador ou estressor. É por aí onde tudo começa, ou seja, todas as reações orgânicas, as atitudes, emoções, comportamentos, alterações químicas fisiológicas, etc e tal, começam sempre à partir do tal estímulo.
Conforme já comentamos, a Ansiedade e o Estresse não são monopólio do ser humano. Se colocarmos um gato junto de um cão num espaço fechado, depois de algum tempo esse gato estará Esgotado; primeiro ele terá muita Ansiedade, entrará em Estresse e, pela continuidade do estímulo agressivo (presença do cão) se esgotará.
Tendo em vista o fato do gato representar para o cão uma ameaça menos agressiva que o cão representa para o gato, o cão ficará esgotado depois do gato. Nesse caso o cão representa para o gato um estímulo agressivo: externo, por estar fora do gato e, inato, por fazer parte da natureza biológica de todos os gatos.

Quadro 2 – ORIGEM E NATUREZA DOS ESTRESSORES
Nos Animais
Nos Seres Humanos
Origem
Natureza
Origem
Natureza
Externos
Condicionados
Externos
Adversidades
Conflitos
Internos
Inatos
Internos
Transtornos Afetivos
Traços de Personalidade
Assim sendo, nos animais os estímulos para desencadear-se a Ansiedade também podem ter duas origens: quanto à natureza eles podem ser inatos, como vimos, do tipo gato tem medo de cachorro ou, de outra forma, condicionados por treinamento e experiência. Quanto à origem serão internos, caso se trate de instintos e externos, quando for o caso do treinamento ou condicionamento (veja Quadro 2 acima).
No ser humano dito civilizado, esses estímulos também costumam ter duas origens; podem ser externos e internos. Os estímulos internos são oriundos dos conflitos íntimos. Os estímulos externos, por sua vez, representam as ameaças concretas do cotidiano de cada um.
Nossa capacidade de conhecer o mundo proporciona uma percepção pessoal da realidade. Essa percepção pessoal da realidade, diferente em cada um de nós, é chamada de procepção da realidade. A principal idéia que devemos ter disso é que a realidade será sempre representada intimamente e de acordo com a personalidade de cada um.
Essa percepção pessoal da realidade engloba toda nossa maneira de ver e sentir o mundo. Engloba não apenas a concepção que temos das coisas que estão fora da gente, como é o mundo objectual, como também os conceitos que temos dentro de nós. Isso inclui a imagem que temos de nós mesmos, ou seja, inclui nossa própria auto-estima.
Nossa auto-estima pode ser representada favoravelmente ou não, de acordo com a tonalidade afetiva de cada um. Algumas pessoas se vêem ótimos, outras se vêem péssimos. Assim sendo, a idéia que nós temos de nós mesmos pode ser um estímulo agressivo e causador de Ansiedade, caso seja uma idéia a nos perturbar constantemente.
É por causa desses estímulos internos que a Ansiedade humana tem sido constante e às vezes patológica. As ameaças externas não costumam ser tão constantes quanto as internas. Vejamos o caso das ameaças concretas acerca de nossa segurança pessoal, por exemplo: a ameaça de ser assaltados, agredidos, morto, etc. Possibilidades até existem, nos grandes centros, mas normalmente não é continuada. Há situações onde podemos nos sentir seguros, racionalmente falando. Por outro lado, o estímulo interno não é racional, é emocional. Isso quer dizer que podemos estar ansiosos devido ao medo de sermos assaltados, agredidos, humilhados, demitidos, etc., embora tais possibilidades sejam mínimas na prática.
Da mesma forma, podemos dizer que ficar doente seja uma ameaça séria, um estímulo ameaçador importante. É claro que é. Entretanto, podemos experimentar uma grande Ansiedade devido ao fato de pensarmos que podemos ficar doentes. Esse estímulo já é interno e não externo. Seria externo caso houvesse, de fato, sinais de que nossa saúde foi abalada. Enquanto houver apenas o medo de passar mal, de poder ficar doente, isso será uma ameaça interna.
Ora, enquanto nos animais os estímulos agressivos externos aparecem periodicamente, no ser humano a presença dos estímulos internos pode ser continuada. Havendo uma afetividade problemática, insegurança e pessimismo, vamos sentir ameaças internas continuadamente. Vamos dormir com essas ameaças e acordar com elas. Portanto, nessas circunstâncias podemos ter o Esgotamento.
Psicologicamente, para o ser humano a agressão depende mais do agente agredido que do agente agressor. Isso quer dizer que o estímulo para desencadear a Ansiedade depende, no mais das vezes, mais da sensibilidade da pessoa do que do estímulo propriamente dito. Para uma pessoa claustrofóbica, estar num elevador não significa simplesmente estar objetivamente num elevador.
Será a Personalidade de cada um quem, de fato, atribuirá valores e significados aos acontecimentos, tomando-os ou não por estressantes, angustiantes, temerosos, ameaçadores e assim por diante. Um Ego funcionando adequadamente é capaz de prover a adaptação necessária entre o mundo externo e interno, ou entre o indivíduo e seu ambiente, ou, finalmente, entre o ser e seu destino. Sempre que houver fragilidade desse Ego, haverá comprometimento na adaptação e desequilíbrio entre o ser e o mundo ou, resumindo, haverá uma Ansiedade crônica.
Como vimos acima, os estímulos capazes de proporcionar a Ansiedade podem ser externos, denominados geralmente de circunstanciais e interpessoais, representados pelo embate entre as forças opressoras do ambiente e as condições da pessoa. Mesmo em se tratando de estímulos externos, provenientes do mundo objetivo, sua natureza agressiva poderá ser mais traumática ou menos traumática, dependendo da conotação à ele atribuída por nossa pessoa. Os estímulos podem ainda ser internos, denominados intrapsíquicos, onde se situam os Conflitos pessoais da pessoa normal ou os transtornos afetivos e traços ansiosos de personalidade nas pessoas mais problemáticas.
A existência dos Conflitos pode ser considerada fisiológica na espécie humana, ou seja, eles existem em todos nós e parecem ser essenciais ao desenvolvimento da Ansiedade. Em nosso cotidiano, sem termos plena consciência, experimentamos um sem-número de pequenos Conflitos, interpessoais ou intrapsíquicos; as tensões entre ir e não ir, fazer e não fazer, querer e não poder, dever e não querer, querer, poder e não dever, a assim por diante.
Finalmente, devemos entender que os estímulos necessários para determinar a Ansiedade são proveniente de duas origens: são externos, quando se devem à sucessão de acontecimentos de nossa vida aos quais temos que nos adaptar e internos, quando se originam dentro de nós mesmos, de nossos medos, nossos pensamentos negativos, nossas inseguranças. No ser humano os estímulos produtores de Ansiedade costumam ser, predominantemente, de origem interna e pessoal, decorrentes da valoração individual que a pessoa atribui à sua realidade e aos fatos com os quais se depara
para referir:
Ballone GJ, Moura EC -Ansiedade, Esgotamento e Estresse - in. PsiqWeb, Internet, disponível em www.psiqweb.med.br, revisto em 2008.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Transtorno Bipolar na Infância

A infância é uma época estratégica da vida do ser humano. É quando se dá um grande desenvolvimento físico, psicológico e mental, concomitantemente ao aprendizado básico indispensável para todos os que se seguirão por toda vida.
A relevância da observação dos comportamentos e aquisições intelectuais da criança e do adolescente feita por pais e professores é imensa, mas não substitui uma avaliação médica e de especialistas em diferentes áreas, quando estes comportamentos fogem da freqüência e intensidade usuais.
Até alguns anos atrás, poucas eram as doenças mentais reconhecíveis na infância. Com o aumento das pesquisas e o incremento de estudos científicos, os diagnósticos de vários transtornos psiquiátricos em crianças e adolescentes tornaram-se possíveis e decorrentes dessa nova condição. Aparentemente, os casos se multiplicaram numericamente e se fizeram mais conhecidos pela população em geral.
Entre esses, o Transtorno do Déficit da Atenção, com ou sem hiperatividade (TDA/H) e o Transtorno do Humor Bipolar (THB) têm sido objeto de muitos estudos em vários países, pois ocasionam forte impacto sobre a vida escolar, pessoal, familiar e mais tarde profissional do paciente, especialmente quando não devidamente diagnosticados e tratados por equipes de profissionais especializados.
O TDA/H, hoje muito comentado em função da amplitude da divulgação na imprensa, é um exemplo. Conhecido dos médicos há várias décadas, com o advento das especializações, como por exemplo a psicopedagogia, passou a ser objeto de estudo multidisciplinar e os resultados dos tratamentos têm sido, em sua grande parte, de enorme valia, tanto para os pacientes, como para suas famílias e a sociedade.
Os prejuízos decorrentes da falta de diagnóstico e do acompanhamento médico e psicopedagógico vão do fracasso escolar à evasão, da baixa auto-estima à depressão, da rejeição do grupo ao isolamento, às drogas, à gravidez precoce, à promiscuidade sexual e marginalização, entre outras.
Infelizmente, a especulação por parte de alguns profissionais não credenciados para tal avaliação, ou ainda, diagnóstico feito por pessoas leigas, tem trazido mais problemas aos que já sofrem com esse transtorno. Generalizou-se, irresponsavelmente, por exemplo, chamar de TDA/H a toda e qualquer manifestação de inquietação, distração ou falta de limite que as crianças e jovens apresentem na escola ou em casa. Como conseqüência, casos em que o transtorno não existe de fato aparecem em toda parte, banalizando um problema sério e de grande repercussão sobre a vida dos pacientes reais e sua família. Estes falsos diagnósticos são geralmente feitos à base de “achismos” como o preenchimento de questionários ou testes sem qualquer base científica ou mesmo ao sabor das conveniências pessoais de alguns adultos, que pensam dela tirar proveito, seja para justificar uma educação deficiente em limites, normas e atenção à criança ou, ainda, a outros interesses particulares.
O Transtorno de Humor Bipolar em crianças é outro exemplo de doença psiquiátrica que exige seriedade no encaminhamento, pois, nessa faixa etária, a sua sintomatologia pode se apresentar de forma atípica.
Assim, ao invés da euforia seguida da depressão dos adultos, nas crianças surge a agressividade gratuita seguida de períodos de depressão. Nestas, o curso do Transtorno é também mais crônico do que episódico e sintomas mistos com depressão seguida de “tempestades afetivas”, são comuns. Além disso, a mudança é rápida e pode acontecer várias vezes dentro de um mesmo dia, como por exemplo: alterações bruscas de humor (de muito contente a muito irritado ou agressivo); notável troca dos seus padrões usuais de sono ou apetite; excesso de energia seguida de grande fadiga e falta de concentração. Esses são alguns sintomas que devem ser observados.
Os diagnósticos de transtornos da saúde mental são difíceis mesmo para os especialistas, pois é alta a prevalência de comorbidades, ou seja, o aparecimento de dois transtornos simultaneamente, o que exige conhecimento, experiência e observação minuciosa do médico e da equipe envolvida, como psicólogos e psicopedagogos.
É importante salientar ainda que estes transtornos afetam seriamente o desenvolvimento e o crescimento emocional dos pacientes, sendo associados a dificuldades escolares, comportamento de alto risco (como promiscuidade sexual e abuso de substâncias), dificuldades nas relações interpessoais, tentativas de suicídio, problemas legais, múltiplas hospitalizações, etc.
Os diagnósticos devem sempre ser realizados por médicos psiquiatras ou neurologistas em conjunto com psicopedagogos, que ao diagnosticarem e acompanharem a criança, se preocupam em dar também orientações à família e à escola.
Minimizar esses transtornos só piora suas conseqüências e prejudica o paciente. Somente especialistas podem afastar e esclarecer as dúvidas e não é exagero ser cuidadoso quando se trata da vida, saúde e futuro dos nossos filhos!
FONTE: http://guiadobebe.uol.com.br/transtorno-bipolar-na-infancia/
Maria Irene Maluf

Transtorno de Atenção e Hiperatividade

Na década de 50 a atividade motora excessiva apresentada por esses pacientes foi valorizada como condição primária para o diagnóstico. No DSM-II (Classificação de Transtornos Mentais da Associação Norte-americana de Psiquiatria - 1968) a nomenclatura foi alterada para “Síndrome Hipercinética da Infância”, enquanto que, em 1987, o mesmo DSM revisado (DSM-III), passou a ser classificar o quadro como “Distúrbio do Déficit de Atenção por Hiperatividade”, em que a inquietação era o elemento essencial. Somente em 1994, no DSM-IV surgiu a nomenclatura atual de “Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade”.
Prevalência
No Brasil a prevalência de TDAH é de 3,6 a 5% da população escolar, sendo o predomínio desatenção encontrado em 25% das crianças. Em adolescentes de 12 a 14 anos, a prevalência é um pouco maior, atingindo 5,8%.

Na população geral a proporção entre os sexos é de 1,5 menino para cada menina, enquanto que em ambulatórios os números se alteram substancialmente (10 meninos : 1 menina) provavelmente pelo fato do subtipo desatento ser o mais encontrado entre as meninas e também, por, aparentemente, causar menor impacto social, que gera  subdiagnóstico e pouco acesso a tratamentos.   

O subtipo mais encontrado é o tipo combinado, desatenção e hiperatividade, que corresponde a 55%, o tipo predominantemente desatento é responsável por 27% dos casos. Estudos revelam que 30 a 70% dos indivíduos afetados continuam apresentando o mesmo comportamento na fase adulta, sendo a prevalência estimada entre adultos jovens de 0,3 a 3,5%, porém, com o crescimento a hiperatividade tende a diminuir e a desatenção permanece constante.

Comorbidades:
Existe uma associação do TDAH com o Transtorno de Conduta e de Oposição (25%) e com Transtornos de Ansiedade (25%). Aproximadamente um terço dos pacientes apresenta depressão, 20 a 25% deles sofrem de algum tipo de Transtorno de Aprendizagem e 2% apresenta Transtorno de Tourette associado.

 Fatores de risco para TDAH
 História familiar
• Parentes homens etilistas ou anti-sociais
 Condição socioeconômica
 Sexo masculino
• Discórdia conjugal
 Divórcio
 Negligência e privação parental
 Abuso
 Retardo mental
 Transtorno de conduta
 Baixo peso no nascimento 


Causas 
Fatores Genéticos:
Estudos de famílias com filhos adotivos e gêmeos verificaram antecedentes de hiperatividade nos pais e falta de associação entre crianças adotadas e pais adotivos. Os pacientes com TDAH têm taxas mais elevadas de alcoolismo e personalidade anti-social entre os pais e existem casos esporádicos sem história familiar positiva.

Metabolismo das Aminas:
Acredita-se que o desequilíbrio neuroquímico nos sistemas neurotransmissores da noradrenalina e da dopamina levaria ao TDAH por baixa produção dessas substâncias ou por sua subutilização.

Disfunção Cerebral Localizada:
 A disfunção do lobo frontal, responsável pela atenção, controle do impulso, organização e atividade continua dirigida ao objetivo, ocorreria por uma perturbação dos processos inibitórios do córtex e por  hipoperfusão do córtex frontal.

Fatores Ambientais e Adquiridos:
Existe uma associação do TDAH com hipóxia perinatal e neonatal, traumas obstétricos, rubéola intra-uterina, encefalite, entre outros. A Hipótese ortomolecular defende que as crianças com TDAH têm uma necessidade constitucional para doses mais elevadas de vitaminas do que as encontradas nas dietas.

Fatores Psicossociais
Os fatores que interferem no desenvolvimento e curso do transtorno são o estilo de criação, a personalidade dos pais e fatores sócio-emocionais. Perdas e separações precoces também são apontadas.

Modelo Interativo-Ativo
Esse modelo estimula o pensamento clínico abrangente sobre o paciente pelo simples fato de que nenhuma hipótese isolada é suficiente para explicar todos os casos.

Diagnóstico e aspectos clínicos
A história clínica deve ser obtida com os pais, professores e cuidadores. É válida a utilização de escalas de classificação como o CONNERS, por exemplo, porém o mesmo não deverá ser usado como base para conclusão diagnóstica.

As queixas dos pais, professores e cuidadores ocorrem antes dos 7 anos e devem interferir em pelo menos duas áreas de atuação da criança (lar, escola, colégio, grupo de amigos).
Um exame clínico cuidadoso e bem conduzido é essencial para avaliar as capacidades da criança, estabelecer diagnósticos diferenciais, além de possibilitar a formação de uma aliança com a criança.

TDAH e Desatenção
No subtipo desatento o intervalo de atenção é curto e conseqüentemente ocorrem falhas em terminar tarefas, dificuldades em escutar e realizar as instruções, esquecimento e negligência. É importante lembrar que a atenção deve ser julgada em relação ao que é normalmente esperado para a idade da criança.

TDAH – Hiperatividade e Impulsividade
As características de hiperativa são a inquietação, contorcimento, dificuldade em ficar sentado, corridas excessivas. A impulsividade é caracterizada por responder prematuramente, passar de uma atividade a outra, impaciência, conclusões precipitadas. Um fator comumente associado é a falha em seguir regras estabelecidas.

Os bebês e pré-escolares com esse transtorno diferem das crianças ativas, por estarem constantemente irriquietos e envolvidos com tudo à sua volta; eles andam para lá e para cá, movem-se “mais rápido que a sombra”, sobem ou escalam móveis, correm pela casa e têm dificuldades em participar de atividades em grupo durante a pré-escola. 

TDAH – Diagnóstico Diferencial
O TDAH é um padrão de comportamento crônico, iniciado antes dos 7 anos de idade e sem alterações do afeto. Deve ser diferenciada dos quadros abaixo:

 TDAH – Diagnóstico Diferencial
 Transtorno de conduta sem TDAH: comportamento mais organizado, padronizado e com intervalo de atenção adequado
 Transtorno de conduta + TDAH: a criança pode brigar freqüentemente porque sua hiperatividade desatenta invade as atividades de outras crianças, ela pode brigar novamente com “as crianças que me provocaram”
 Transtorno desafiador opositor
 Depressão, mania
 Transtorno de ansiedade
 Transtorno invasivo do desenvolvimento


Tratamento Farmacológico
1-Estimulantes
A partir da década de 80, ao contrário do que se pode pensar, estudos comprovaram a eficácia de estimulantes (efeito paradoxal em crianças) no tratamento do TDAH.

As drogas psicoestimulantes são utilizadas no tratamento de crianças e adolescentes desde 1930. Seu mecanismo de ação é a estimulação de receptores alfa e beta-adrenérgicos diretamente, ou a liberação de dopamina e noradrenalina dos terminais sinápticos, indiretamente. O início de ação ocorre após 30 minutos da ingestão do fármaco, com pico em 1 ou 2 horas e meia-vida de 2 a 3 horas.

Um dos estimulantes mais avaliados foi o Metilfenidato (Ritalina®), em dosagens que variam entre 0.3 a 1 mg/kg/dia. A d-anfetamina (Biphetamine®- EUA) nas dosagens entre 0.15 a 0.5 mg/kg/dia e a Pemolina (Cylert® - EUA) em dosagens de 18 a 56 mg/kg/dia. Apenas a Ritalina® se encontra disponível no Brasil.

O metilfenidato (Ritalina®) foi sintetizado em 1955 e ainda hoje é considerado a primeira escolha no tratamento do TDAH. Essa é a conduta da Associação Americana de Psiquiatria da Infância e Adolescência, enfatizando que essa substância deve ser utilizada em qualquer caso de TDAH.

Há uma nova apresentação do metilfenidato no Brasil chamada Concerta©, ou Ritalina RD© Em outros países existem outros medicamentos pertencentes ao grupo desses estimulantes, tais como a dextroanfetamina e uma mistura de quatro diferentes estimulantes denominada Aderall©.

Segundo alguns autores, uma das vantagens da nova apresentação do metilfenidato (Concerta® ou Ritalina RD©) em relação à atualmente existente (Ritalina®) é que, embora ambos produtos utilizem o mesmo metilfenidato, a nova apresentação permite a comodidade de dose única diária (cujo efeito dura cerca de 12 horas).

Os efeitos colaterais mais encontrados são a insônia, diminuição de apetite, dor abdominal e cefaléia. Em relação ao apetite, os pais devem estar cientes do fato e estimular a ingestão de alimentos mais calóricos. Para amenizar a dor abdominal os pais devem oferecer a medicação junto as refeições. Em caso de cefaléia a criança poderá usar analgésicos simples. A administração da medicação não deve ser feita perto do horário de dormir para evitar a insônia.

2-Antidepressivos Tricíclicos
Para as crianças que por algum motivo não possam fazer uso do metilfenidato outras medicações podem ser tentadas, mas a eficácia delas é menor. Os antidepressivos podem diminuir a agressividade, melhorando também os sintomas de ansiedade e depressão habitualmente presentes em portadores de TDAH.

A Imipramina (Tofranil®, Imipra®) parece ser, dos tricíclicos, um dos que apresenta ótima resposta terapêutica para o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade. É usado na dose de 1 e 3 mg/kg/dia.

A Nortriptilina (Pamelor®) vem sendo empregada também para o tratamento desse transtorno. A dose de Nortriptilina varia entre 0.4 e 4.5 mg/kg/dia (média de 1.7mg/kg/dia), entretanto, não foram encontrados estudos prospectivos controlados avaliando seu uso no tratamento de TDAH.

3- Antidepressivos ISRS
Exite ainda pouca experiência com os antidepressivos inibidores seletivos da recaptação da serotonina para o tratamento do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, entretanto as perspectivas são bastante otimistas. A Fluoxetina (Prozac®, Verotina®, Daforim®, Fluxene®, Eufor®, Nortec®, Deprax®) tem sido usada com sucesso na dose de 0,5 a 1mg/Kg/dia.

4- Neurolépticos
Os Neurolépticos: devem ser reservados apenas para casos muito especiais, em geral quando existe, junto com a hiperatividade e déficit de atenção, também retardo mental associado.

Embora os neurolépticos (Neuleptil®, Melleril®, etc) possam ser o tratamento preferido dos neurologistas para o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade, a maioria dos estudos comparativos entre antipsicóticos aos estimulantes apontam quase unanimemente para uma eficácia clínica muitíssimo superior dos estimulantes. A Risperidona (Risperdal®) poderá, eventualmente, ser tentada experimentalmente.

5-Cafeína
Nos EUA a cafeína tem sido muito pouco utilizada para o tratamento do Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade devido às facilidades para a prescrição do Metilfenidato (Ritalina®). No Brasil para a prescrição de Ritalina® há necessidade de receituário especial para entorpecentes (cor rosa) que somente a Secretaria da Saúde fornece.

Assim sendo, a cafeína pode ser utilizada com o mesmo propósito estimulante do metilfenidato, mas as pesquisas são controversas em relação aos resultados. Alguns estudos afirmam que a maioria das crianças portadoras de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade responde bem ao tratamento com a cafeína, formulada em farmácias de manipulação na dose de 10 mg/kg/dia, dividido em 3 tomadas. Outros estudos contestam afirmando que não há melhora expressiva do quadro.

Segundo a Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA) não existem estudos comprovando a eficácia da cafeína em crianças com TDAH. Os poucos estudos científicos mostram que o efeito é semelhante ao do placebo (substância sem efeito) e não é superior ao efeito dos estimulantes. A cafeína só demonstrou ter algum efeito positivo sobre a atenção em indivíduos normais que não eram portadores de TDAH.

6-Outros fármacos
Dos outros fármacos, apenas a Carbamazepina (Tegretol®, Tegretard®) parece ter alguma eficácia para o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade quando o caso é refratário aos medicamentos anteriormente citados. Outros fármacos como os benzodiazepínicos (Valium®, Diempax®, Rivotril®), o propranolol e o carbonato de lítio não se mostram clinicamente eficazes no tratamento desse distúrbio.

Início e Duração do Tratamento
O início do tratamento deve ser precoce, porém a maioria dos familiares protelam o tratamento por preconceito e razões culturais (onde já se viu dar esses remédios para crianças??), por razões familiares (os avós acham que os pais também eram assim quando pequenos) ou por falta de acesso a informações. Esse último não é monopólio dos familiares, já que muitos profissionais médicos e psicólogos são completamente contrários ao tratamento medicamentoso por completa ignorância técnica e científica.

De qualquer maneira, a maioria dos pacientes acaba procurando um médico, muitas vezes um neurologista (por receio de dizer que o filho vai ao psiquiatra), tão logo a professora reclame do rendimento escolar da criança. Nem mesmo as constantes queixas de comportamento sensibilizam os pais para o tratamento, mas a ameaça de perder o ano é fatal para a decisão.

Portanto, o tratamento começa por na idade escolar, pelas razões citadas, e deve permanecer até o início da adolescência (11-13 anos). A questão mais importante no tratamento é o reconhecimento e aceitação da família quanto a essa necessidade imperiosa; não só para o bom desenvolvimento da criança, senão também para maior conforto dos pais e socialização adequada do paciente.

para referir
Ximenes BAA - Déficit de Atenção e Hiperatividade, in. PsiqWeb.

Transtorno Desafiador Opositivo



A característica essencial do Transtorno Desafiador Opositivo é um padrão recorrente de comportamento negativista, desafiador, desobediente e hostil para com figuras de autoridade, que persiste por pelo menos 6 meses (Critério A) e se caracteriza pela ocorrência freqüente de pelo menos quatro dos seguintes comportamentos: perder a paciência (Critério A1), discutir com adultos (Critério A2), desafiar ativamente ou recusar-se a obedecer a solicitações ou regras dos adultos (Critério A3), deliberadamente fazer coisas que aborrecem outras pessoas (Critério A4), responsabilizar outras pessoas por seus próprios erros ou mau comportamento (Critério A5), ser suscetível ou facilmente aborrecido pelos outros (Critério A6), mostrar-se enraivecido e ressentido (Critério A7), ou ser rancoroso ou vingativo (Critério A8).

A fim de se qualificarem para o Transtorno Desafiador Opositivo, os comportamentos devem ocorrer com mais freqüência do que se observa tipicamente em indivíduos de idade e nível de desenvolvimento comparáveis e deve acarretar prejuízo significativo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional (Critério B).

O diagnóstico não é feito se a perturbação do comportamento ocorre exclusivamente durante o curso de um Transtorno Psicótico ou do Humor (Critério C) ou se são satisfeitos os critérios para Transtorno de Conduta ou Transtorno da Personalidade Anti-Social (em um indivíduo com mais de 18 anos).

Os comportamentos negativistas ou desafiadores são expressados por teimosia persistente, resistência a ordens e relutância em comprometer-se, ceder ou negociar com adultos ou seus pares. O desafio também pode incluir testagem deliberada ou persistente dos limites, geralmente ignorando ordens, discutindo e deixando de aceitar a responsabilidade pelas más ações.

A hostilidade pode ser dirigida a adultos ou a seus pares, sendo demonstrada ao incomodar deliberadamente ou agredir verbalmente outras pessoas (em geral sem a agressão física mais séria vista no Transtorno da Conduta). As manifestações do transtorno estão quase que invariavelmente presentes no contexto doméstico, mas podem não ser evidentes na escola ou na comunidade.

Os sintomas do transtorno tipicamente se evidenciam mais nas interações com adultos ou companheiros a quem o indivíduo conhece bem, podendo assim não serem perceptíveis durante o exame clínico. Em geral, os indivíduos com este transtorno não se consideram oposicionais ou desafiadores, mas justificam seu comportamento como uma resposta a exigências ou circunstâncias irracionais.

Características e Transtornos AssociadosAs características e transtornos associados variam em função da idade do indivíduo e gravidade do Transtorno Desafiador Opositivo.

No sexo masculino, o transtorno é mais prevalente entre aqueles indivíduos que, nos anos pré-escolares, têm temperamento problemático (por ex., alta reatividade, dificuldade em serem acalmados) ou alta atividade motora.

Durante os anos escolares, pode haver baixa auto-estima, instabilidade do humor, baixa tolerância à frustração, blasfêmias e uso precoce de álcool, tabaco ou drogas ilícitas. Existem, freqüentemente, conflitos com os pais, professores e companheiros. Pode haver um círculo vicioso, no qual os pais e a criança trazem à tona o que há de pior um do outro.

O Transtorno Desafiador Opositivo é mais prevalente em famílias nas quais os cuidados da criança são perturbados por uma sucessão de diferentes responsáveis ou em famílias nas quais práticas rígidas, inconsistentes ou negligentes de criação dos filhos são comuns.

O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade é comum em crianças com Transtorno Desafiador Opositivo, bem como os Transtornos da Aprendizagem e da Comunicação.

Características Específicas à Idade e ao GêneroUma vez que o comportamento oposicional temporário é muito comum em crianças pré-escolares e adolescentes, deve-se ter cuidado ao fazer o diagnóstico de Transtorno Desafiador Opositivo, especialmente durante esses períodos do desenvolvimento. O número de sintomas de oposição tende a aumentar com a idade.

O transtorno é mais prevalente em homens do que em mulheres antes da puberdade, mas as taxas são provavelmente iguais após a puberdade. Os sintomas em geral são similares em ambos os gêneros, à exceção do fato de que os homens podem apresentar mais comportamentos de confronto e sintomas mais persistentes.

Prevalência
As taxas de Transtorno Desafiador Opositivo são de 2 a 16%, dependendo da natureza da amostra populacional e métodos de determinação.

Curso
O Transtorno Desafiador Opositivo em geral se manifesta antes dos 8 anos de idade e habitualmente não depois do início da adolescência. Os sintomas opositivos freqüentemente emergem no contexto doméstico, mas com o tempo podem aparecer também em outras situações.

O início é tipicamente gradual, em geral se estendendo por meses ou anos. Em uma proporção significativa dos casos, o Transtorno Desafiador Opositivo é um antecedente evolutivo do Transtorno da Conduta.

Padrão FamilialO Transtorno Desafiador Opositivo parece ser mais comum em famílias nas quais pelo menos um dos pais tem uma história de Transtorno do Humor, Transtorno Desafiador Opositivo, Transtorno da Conduta, Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, Transtorno da Personalidade Anti-Social ou um Transtorno Relacionado a Substâncias.
Além disso, alguns estudos sugerem que as mães com Transtorno Depressivo estão mais propensas a terem filhos com comportamento oposicional, mas não está claro o grau em que a depressão materna é causa ou conseqüência do comportamento oposicional nas crianças. O Transtorno Desafiador Opositivo é mais comum em famílias nas quais existe séria discórdia conjugal.

Diagnóstico DiferencialOs comportamentos diruptivos dos indivíduos com Transtorno Desafiador Opositivo têm uma natureza menos severa do que os de indivíduos com Transtorno da Conduta e tipicamente não incluem agressão a pessoas ou animais, destruição de propriedades ou um padrão de furto ou defraudação.

Uma vez que todos os aspectos do Transtorno Desafiador Opositivo em geral estão presentes no Transtorno da Conduta, aquele não é diagnosticado se são satisfeitos os critérios para Transtorno da Conduta. O comportamento opositivo é uma característica associada comum dos Transtornos do Humor e dos Transtornos Psicóticos que se apresentam em crianças e adolescentes, não devendo ser diagnosticado em separado se os sintomas ocorrem exclusivamente durante o curso de um Transtorno do Humor ou Psicótico.

Os comportamentos de oposição também devem ser diferenciados do comportamento diruptivo que resulta da desatenção e impulsividade no Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade. Quando os dois transtornos ocorrem simultaneamente, ambos os diagnósticos devem ser feitos.

Em indivíduos com Retardo Mental, um diagnóstico de Transtorno Desafiador Opositivo é dado apenas se o comportamento oposicional é acentuadamente maior do que aquele em geral observado entre indivíduos de idade, gênero e gravidade do Retardo Mental comparáveis.

O Transtorno Desafiador Opositivo também deve ser diferenciado de um fracasso em obedecer a comandos resultante de prejuízo na compreensão da linguagem (por ex., perda auditiva, Transtorno Misto da Linguagem Receptivo-Expressiva).

O comportamento oposicional é uma característica típica de certos estágios do desenvolvimento (por ex., infância ou adolescência). Um diagnóstico de Transtorno Desafiador Opositivo deve ser considerado apenas se os comportamentos ocorrem com maior freqüência e têm conseqüências mais sérias do que se observa tipicamente em outros indivíduos de estágio evolutivo comparável e se acarretam prejuízo significativo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional.

Um novo início de comportamentos opositivos na adolescência pode ser devido ao processo normal de individuação.
Fonte: http://www.psiqweb.med.br/site/DefaultLimpo.aspx?area=ES/VerClassificacoes&idZClassificacoes=221

sábado, 26 de maio de 2012

Depressão na menopausa


Não se pode dizer, com certeza, se a depressão na menopausa é realmente causada pela própria menopausa, como conseqüência das alterações biológicas e endócrinas desse período, da mesma forma que acontece com a osteoporose ou com as ondas de calor, se a depressão aparece juntamente com a menopausa como coincidência, ou ainda, se é um reagravamento de estados depressivos anteriores.
É a sensibilidade individual, possivelmente, uma das questões mais importantes no desenvolvimento da depressão na menopausa. Dessa sensibilidade fazem parte as idiossincrasias pessoais, capazes de vulnerabilizar a mulher às alterações hormonais, tal como acontece na Tensão Pré Menstrual ou na Depressão Pós-parto, o psicodinamismo próprio de cada pessoa e a capacidade afetiva de cada um para adaptação às diversas fases da vida. Aqui importam a adaptação emocional à menopausa, os conflitos atuais e passados e o perfil afetivo pregresso da paciente.
Nicol (1996), revendo 94 artigos dos últimos 30 anos, considera os dados insuficientes para dizer-se, com certeza, ser a menopausa a causa da depressão em mulheres que atravessam esse período evolutivo. Há uma tendência recente em considerar os sintomas da menopausa como sendo causados pela combinação de vários fatores e não apenas à falência ovariana. Valorizam-se as alterações orgânicas possíveis no climatério, influências culturais, sensibilidade individual e dificuldades sociais, entre outros bons motivos para a sintomatologia menopáusica (Robinson, 1996).
Tenhamos ou não a certeza do papel hormonal no desenvolvimento da depressão menopáusica, uma coisa parece certa: há uma maior incidência de depressão em mulheres peri-menopáusicas e menopáusicas do que em mulheres pré-menopáusicas (Baker, 1997). A Depressão Peri-Menopáusica é aquela detectada até 5 anos antes da menopausa propriamente dita. Em relação à depressão na população geral, existem referências sobre alterações na incidência de depressão entre homens e mulheres depois dos 50 anos: antes dos 50 anos a incidência entre os sexos é aproximadamente a mesma e, depois dessa idade, é francamente mais prevalente em mulheres (Bebbington e cols., 1998).
Não se pode negar existirem mulheres emocionalmente mais vulneráveis às variações circadianas de sua constelação hormonal, seja por ocasião da menarca, do período pré-menstrual, pós-parto e, evidentemente, da menopausa. Ainda que seja certo, também, uma grande probabilidade dessas pacientes serem emocionalmente vulneráveis às demais mudanças em suas vidas, além das hormonais. Para a paciente que está diante de seu médico queixando-se de depressão, além dos outros sintomas da menopausa, pouco interessa saber se aquele mal estar emocional é tido como conseqüência ou comorbidade desta. Seu desejo é pela resolutividade.
Incidência Evidentemente não se pode falar ainda, com certeza, numa determinada incidência da síndrome sintomática da menopausa. Não se pode falar em incidência por não se ter um consenso entre os autores sobre quais seriam, exatamente, os sintomas da menopausa. Ora, não se chegando a um acordo sobre quais são os sintomas seguramente associados à menopausa não será possível estabelecer-se, com certeza, qual seria sua incidência baseada num quadro clínico.
Porter (1996), por exemplo, representando autores mais generosos, detecta um quadro menopáusico significativo em 57% das mulheres, tomando por base uma lista de 15 sintomas associados à menopausa. Dessas pacientes, apenas 22% atribuíram importância relevante às suas queixas e nem sempre associavam, por si mesmas, a depressão emocional como um dos sintomas atrelados ao quadro menopáusico, embora este sintoma estivesse fortemente presente.
Corroborando isso, Zhao (1996) encontra uma incidência de depressão em 46,1% de 419 mulheres com idade entre 45 e 55 anos. Entre essas pacientes, 30,1% apresentavam os sintomas depressivos em grau moderado ou severo e o restante em grau leve. Para Punyahotra (1997), os sintomas mais comuns que aparecem em 51% das pacientes menopausadas foram dores nas juntas, ondas de calor, atrofia da mucosa vaginal, depressão emocional e insônia.
Por outro lado, Coope (1996), menos flexível, restringe ao máximo aquilo que considera sintomas da menopausa. Para ele, somente as ondas de calor, suores noturnos (sintomas vasomotores) e ressecamento vaginal estariam diretamente associados à falência ovariana pois, como observa, são os únicos que respondem bem à reposição hormonal isoladamente. A artralgia, a depressão e outros sintomas emocionais podem ser encontradiços na meia idade e não seriam exclusivos e/ou específicos da menopausa. Tais sintomas, ele mesmo reconhece, não são responsivos à terapêutica hormonal isolada.
A idade média para aparecimento da menopausa, segundo pesquisa com 268 mulheres na Inglaterra, foi de 50,13 anos (Punyahotra, 1997). Outros autores preferem não estabelecer uma idade média para a menopausa, tendo em vista as inúmeras variáveis individuais. Cramer (1996) parte do princípio que uma mulher deve experimentar uma média de 300 ciclos durante sua vida. As variáveis que considera significativas para a menopausa mais precoce são o tabagismo, a depressão emocional, a ooforectomia em adulta jovem e a história familiar de menopausa precoce. Portanto, na década de 90 corrobora-se a idade média para a menopausa como sendo a mesma calculada há muitas décadas, ou seja, em torno dos 50 anos.
Fatores Predisponentes e Fisiopatológicos
Apesar dos achados hormonais não estarem diretamente relacionados às alterações emocionais, Saletu e cols. (1996), mediante minucioso trabalho em 129 mulheres menopausadas, concluíram que baixos níveis de estradiol contribuem para a diminuição do nível de vigilância neurofisiológica a qual, por sua vez, se relacionaria com a sintomatologia depressiva da menopausa. Este nível de vigilância neurofisiológica foi criteriosamente avaliada eletroencefalograficamente e a depressão associada à tal achado correlacionou-se com uma hiperatividade frontal direita e hipoatividade frontal esquerda.
E, de fato, o estrogênio parece exercer algum efeito sobre o comportamento, cognição e emoção através de sua interação com os neuroreceptores estrogênicos. As alterações neuro-endócrinas conseqüentes aos níveis diminuídos dos estrogênicos têm sido associados à diversas alterações emocionais ou à recorrência de transtornos afetivos anteriores em várias fases da vida feminina, notadamente nos períodos pré-menstruais, puerperais e do climatério. Stahl (1998) prevê que os avanços na administração de antidepressivos associados à estrogênios para essas pacientes expandirão as fronteiras da psiquiatria feminina.
Arpels (1996), pesquisa casos de Tensão Pré-menstrual, de Depressão Pós-parto e Depressão Peri-menopáusica e menopáusica, relacionando os sintomas emocionais próprios desses períodos como sendo a depressão, distúrbios do sono, irritabilidade, ansiedade, pânico e distúrbios de memória. Adepto da idéia acerca da influência estrogênica sobre o sistema nervoso, esse autor chega a afirmar que o cérebro, em mulheres, é um órgão alvo do estrogênio ("the brain in women has been shown to be an estrogen target organ").
Antecedentes afetivos pessoais parecem ser, entre os autores, um dos fatores predisponentes de maior peso para o surgimento da depressão na menopausa. Em 1996, Woods pesquisou a ocorrência de 4 modalidades de humor na fase menopáusica: depressão franca, traços depressivos, depressão controlada e ausência de depressão. A depressão franca era mais freqüente entre as pacientes com sintomas vasomotores (ondas de calor) e com história pregressa de síndrome pré-menstrual e depressão pós-parto. A presença de antecedentes afetivos em pacientes com depressão menopáusica é corroborada por outros autores. Pearlstein (1997), também estabelece relações entre o risco aumentado para depressão peri e menopaúsica com antecedentes pessoais de transtorno afetivo e com alterações afetivas relacionadas ao parto e puerpério.
Entre os fatores somáticos que favorecem a ocorrência de sintomas menopáusicos depressivos deve-se destacar a Diabetes Melitus Insulino Dependente. Malacara e cols. (1997), comparando diabéticas e não diabéticas, constataram que as mulheres diabéticas apresentavam uma prevalência maior de sintomas emocionais na menopausa, e entre esses a depressão.
Também se pode constatar um aumento significativo na incidência de depressão no climatério num grupo de 285 mulheres histerectomizadas previamente em comparação à um grupo não histerectomizado (Carranza, 1997). Neste caso a depressão ocorreu com freqüência maior do que as alterações dos níveis hormonais, de lipídeos e da densidade óssea.
Base de Tratamento
A questão do tratamento dos sintomas molestos da menopausa repousa em algumas questões ainda não totalmente esclarecidas: deve-se ou não tratá-los? deve-se ou não tratá-los com reposição hormonal? Deve-se ou não tratá-los com reposição hormonal isoladamente?
Pela média dos trabalhos dos dois últimos anos, tem sido vantajoso o tratamento dos sintomas menopáusicos. Entre os tratamentos propostos tem prevalecido o Tratamento de Reposição Hormonal (TRH). Quanto a ser melhor este tipo de tratamento na forma isolada parece não haver ainda um consenso.
Em 1998 Pisani estuda dois grupos de 44 mulheres na menopausa; o primeiro grupo submetido à tratamento transdérmico de hormônio-terapia e o segundo fazendo uso de placebo. Os sintomas menopáusicos em ambos os grupos apareceram na seguinte incidência: ondas de calor em 65%, ansiedade em 60%, depressão em 50%, parestesias e astenia em 40%, insônia em 35%, diminuição da memória em 30%, ressecamento vaginal e dispareunia em 15%. Além desses sintomas associados à menopausa o autor procurava avaliar também o interesse sexual das pacientes. A conclusão do autor aponta para a insuficiência do tratamento com hormônios, isoladamente, para a resolução satisfatória de todos esses sintomas, embora tenha havido melhora das ondas de calor, insônia e ressecamento vaginal.
Ainda sobre os acanhados efeitos terapêuticos de hormônios usados isoladamente no tratamento da síndrome da menopausa, Pearce (1997) é mais contundente ao concluir não haver grandes diferenças no alívio dos sintomas físicos ou psíquicos, até dois meses depois de iniciado o tratamento em comparação com placebo.
Outros trabalhos apontam para efeitos mais satisfatórios da hormonioterapia de reposição isoladamente no quadro da menopausa. Pearlstein considera satisfatório esse tratamento para alívio dos sintomas vasomotores, ósseos e genitais. Para a depressão, entretanto, não vê benefícios significativos só com os hormônios e recomenda também a associação de antidepressivos.
Terapia de Reposição HormonalAtualmente milhões de mulheres pré, pós ou menopáusicas, no mundo todo, estão recebendo de seus ginecologistas e geriatras o que se conhece por Terapia de Reposição Hormonal. A literatura médica tem sido bastante abrangente sobre os benefícios, riscos, efeitos indesejáveis, indicações e contra-indicações da estrogênio-terapia (terapia de reposição com o hormônio feminino estrogênio).
Indicações para Terapia Hormonal
A terapia de reposição hormonal com estrogênio para mulheres pós-menopausa teve, inicialmente, indicação para prevenir a osteoporose freqüente dessa faixa etária e para diminuir os riscos de infarto do miocárdio.
Observou-se que as mulheres submetidas a esse tipo de terapia hormonal também acabavam tendo um aumento da elasticidade e turgência da mucosa vaginal, do tecido perineal e peri-uretral, tecidos estes, fisiologicamente mais ressecados com a menopausa. Tal mudança resolvia, indiretamente, o problema da dor na relação sexual por ressecamento vaginal e a queixa crônica de urgência miccional (vontade de urinar com rapidez e de pouco em pouco), muito incômodos nessa faixa etária.
Além disso, o tratamento a base de estrogênios para a menopausa resolvia também a questão dos tradicionais "fogachos", ondas de calor determinadas por um sintoma vasomotor, bem como atenuava significativamente a depressão própria do climatério e devida ao decréscimo fisiológico dos hormônios.
Mulheres mais jovens que tenham sido submetidas à retirada cirúrgica dos ovários também podem requerer doses substitutivas de hormônios para evitar os problemas típicos da falta desses; "fogachos", osteoporose, ressecamento vaginal, etc.
Contra-indicações da Terapia Hormonal A Terapia por Reposição de Estrogênio (TRE) está formalmente contra-indicada nas mulheres com história de hemorragias vaginais ou acidentes vasculares, do tipo trombo-embólicos (tromboses, embolias e varizes ou hemorróidas graves).
Quando começar e quando parar com hormôniosEm geral a menopausa, em caráter estrito, é definida clinicamente como um período de seis meses de amenorréia (sem menstruações). Caso não haja história de sangramentos vaginais anormais, a TRE pode ser iniciada nessa fase. Ocasionalmente o tratamento pode ter início antes do período de amenorréia, caso existam sintomas incômodos, tais como as ondas de calor e crises de ansiedade, choro ou angústia que antes não existiam.
Atualmente os testes de Densitometria Óssea, que calculam a perda de cálcio dos ossos, tem sido um dos fatores determinantes para o início do tratamento hormonal. Normalmente esse exame é mais decisivo do que a constatação de alterações hormonais no exame de sangue (dosagem de FSH).
Uma das questões que mais incomoda a cliente e o clínico é sobre o tempo desse tratamento hormonal. Quantos anos, depois da menopausa, se poderia continuar tomando estrogênios? Alguns autores preferem continuar a TRE indefinidamente em mulheres com algum grau significativo de osteoporose.
Terapia AntidepressivaA terapia antidepressiva para mulheres peri ou menopáusicas tem indicação formal quando se detectam sintomas depressivos de moderados a graves. Se essa terapia se dará isoladamente ou associada aos hormônios é uma questão que deve ser avaliada para cada caso. De qualquer maneira, essa associação costuma resolver a expressiva maioria dos casos de grave Depressão na Menopausa.
A prescrição de antidepressivos para pacientes na meia-idade deve observar alguns aspectos importantes. A sedação, por exemplo, pode ser um efeito colateral bastante incômodo, considerando os riscos de fraturas e a limitação sócio-ocupacional. Os efeitos anticolinérgicos também devem ser considerados, tanto para os pacientes cardiopatas, quanto para os idosos em geral, mais sensíveis à esses efeitos (Cohen, 1997).
Por questões de segurança em relação aos efeitos colaterais, os antidepressivos ISRS têm sido preferidos aos tricíclicos, preferência que se justifica ainda mais diante de algumas situações clínicas encontradiças na meia-idade, como pode ser o caso dos problemas cardiocirculatórios ou da sensibilidade aumentada para efeitos anticolinérgicos (Reynolds, 1996). Entre os ISRS a fluoxetina pode ser iniciada na dose de 10 mg/dia e aumentada para 20 mg/dia (von Moltke, 1993) e a sertralina pode ser iniciada com 25-50 mg/dia, podendo chegar à 100 mg/dia (Armstrong, 1997).
Conclusão
Tendo em vista que o quadro depressivo da menopausa não costuma ser diferente do Episódio Depressivo especificado na CID.10 (Classificação Internacional de Doenças) e no DSM.IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders), tendo em vista também que não se pode estabelecer, com certeza, se a depressão peri ou menopáusica depende diretamente das alterações hormonais ou se é apenas uma comorbidade à elas e, tendo em vista ainda que a literatura tem apontado para uma não resolutividade do tratamento hormonal isolado para esses estados depressivos, está mais que justificado associar-se ao eventual tratamento hormonal para a sintomatologia da menopausa, também o tratamento psicofarmacológico com antidepressivos.
À cliente interessa o alívio e o bem estar. Independentemente de a literatura mundial digladiar-se com diversas tendências e teorias sobre a determinância ou não dos hormônios sobre os sintomas depressivos, o bom senso deve nortear a conduta médica de caso-a-caso. Ao clínico deve interessar a questão da segurança dos antidepressivos atuais, seus efeitos colaterais, a questão da dependência ou não, a sedação desnecessária e, principalmente a relação custo-benefício.
Entre os antidepressivos utilizados na meia idade, como é o caso da paciente menopáusica, deve-se escolher aqueles com menores efeitos colaterais. As pessoas mais idosas costumam ter sensibilidade aumentada aos efeitos anticolinérgicos próprios dos antidepressivos tricíclicos, podendo apresentar francos episódios de confusão mental em alguns casos.
Embora algumas pesquisas tenham sugerido que os antidepressivos tricíclicos sejam tão eficientes quanto os antidepressivos Inibidores Seletivos de Recaptação de Serotonina (ISRS) em alguns tipos de depressão da meia-idade, a maioria dos autores tem recomendado antidepressivos ISRS como primeira escolha devido à sua segurança.
Esta segurança diz respeito à ausência de (ou muito escassos) efeitos anticolinérgicos, cardiovasculares e sedativos dos inibidores seletivos em comparação aos tricíclicos, conseqüentemente à maior tolerabilidade à esses ISRS (Reynolds, 1996). Ente esses ISRS recomendados destacam-se a fluoxetina e a sertralina.
para referir:
Ballone GJ, Moura EC - Depressão na Menopausa - in. PsiqWeb, Internet, disponível em www.psiqweb.med.br, revisto em 2008

Lua.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Depressão e frustração


 A razão desse artigo é refletir sobre a possibilidade da psiquiatria estar tratando sofrimentos emocionais decorrentes de frustrações da vida social moderna com o mesmo método e justificativa com que trata do Transtorno Depressivo. Não se trata de validar ou não a utilização de antidepressivos, inegavelmente úteis no alívio e na melhora da qualidade de vida emocional, mas sim da conscientização do problema e da conceituação dos quadros de depressão e, digamos, de frustração. Talvez a psiquiatria esteja tratando conseqüências individuais de uma patologia social subjacente.

A qualidade da vida emocional depende da satisfação com que se vive. Se preferir, a qualidade de vida depende da felicidade, e esta, depende de nosso destino coincidir com nossa vontade, ou seja, estamos felizes se esta acontecendo agora aquilo que eu queria que estivesse mesmo acontecendo. Mas esse evento não é tão simples como parece. A coincidência vontade-destino é mais abrangente do que a simples sucessão dos acontecimentos. Para ser completa a idéia de felicidade, os sentimentos devem ser, nesse momento, justamente aqueles que eu mais queria estar sentindo (agora).
Na prática, isso quer dizer que não basta estar em uma praia paradisíaca curtindo as férias, mas também estar satisfeito e sentindo que minha felicidade está plenamente presente. Também o prognóstico de vida faz parte da sensação de felicidade, ou seja, a sensação de que as coisas continuarão sendo boas.
Juntando essa idéia com a natural aptidão humana para o desejo, para a expectativa, para a pretensão, e sabendo que nos frustramos na proporção em que pretendemos, fica mais clara a idéia de John Stuart Mill ao dizer  que “aprendeu a procurar a felicidade limitando os desejos, ao invés de satisfazê-los”.
Tentaremos refletir sobre a diferença entre depressão e frustração, ou melhor, diferenciar a tristeza conseqüente às frustrações cotidianas e fisiológicas do homem moderno, os aborrecimentos do dia-a-dia, os sentimentos de perda, luto, contrariedade, da depressão propriamente dita, que é uma condição patológica, limitante, e que implica na necessidade de tratamento específico adequado.
Falar em frustração não significa falar de algo doentio, mórbido. A frustração, é uma ocorrência universal e comum a todas pessoas conscientes das condições de sua existência, significa algo necessário ao amadurecimento e, conseqüentemente, ao desenvolvimento do sujeito, de sua relação com o mundo objectual (sua realidade), com os outros e consigo próprio.
O ser humano, tal como os animais superiores, tende a fugir da dor e se aproximar do prazer. Portanto, há sempre uma pretensiosa tentativa de suprimir o sofrimento das frustrações ou das perdas. Entre as várias maneiras que o ser humano usa para essa fuga da dor, incluindo os mecanismos de defesa, as negações, compensações, etc, tudo isso como parte um leque de recursos interiores, recorre-se também à ajuda externa, algo de fora da pessoa.
Antigamente nossos ancestrais aliviavam o sofrimento buscando ajuda externa no feiticeiro, no pajé, no sacerdote ou coisas assim. O ser humano atual busca um “algo mágico”, lenitivo para seus sofrimentos, na expectativa que tem da medicina, da ciência e da tecnologia. São programas, técnicas, pílulas, terapeutas, meditações, alguma coisa milenar, práticas exóticas e alternativas, enfim, a sociedade dispõe de mil recursos aliviatórios.
Porém, não são poucas as hipóteses de ser saudável e até desejável, vivenciar os sentimentos proporcionados pelas adversidades da vida, pelas dificuldades e frustrações das relações humanas. Parece que quando existe excesso de investimento psicoterápico, excesso de intervenções farmacológicas, superproteção familiar, enfim, qualquer esforço sociocultural no sentido de dissimular e minimizar os sentimentos próprios dessas frustrações naturais da vida, a pessoa poderá não desenvolver a necessária capacidade de superar dificuldades existenciais.
Vivenciar perdas, experimentar a melancolia e a tristeza diante das frustrações são processos importantes para o amadurecimento psíquico e aprimoramento das relações sociais. A Depressão não pode ser compreendida como sinônimo do sentimento de tristeza e melancolia que qualquer pessoa experimenta diante das dificuldades e frustrações, mas sim, como um quadro patológico próprio e específico, relativamente emancipado dos eventos existenciais.
Depressão e Tristeza
Há, sem dúvida, abuso e banalização do termo “depressão”. Mas nem toda sintomatologia encontrada na Depressão, assim como tristeza, desinteresse, apatia, perda de prazer com as coisas pode ser considerada doença depressiva ou algum transtorno do afetivo. Muitas vezes trata-se de um reflexo emocional de circunstâncias vivenciais frustrantes.
A busca do gozo e do prazer, o hedonismo dominante da sociedade moderna, quando não está continuamente presente na vida da pessoa, quando não mobiliza para o lazer, quando não se manifesta com extroversão, inquietação ou euforia, acaba causando um estranhamento capaz de fazer pensar em alguma coisa anormal, mórbida, patológica.
Curiosamente encontramos com freqüência jovens que, por razões de personalidade, escapam ao modelo sociocultural ocidental de expansividade e extroversão e são incomodamente considerados “problemáticos”. Quase sempre são jovens naturalmente introspectivos, reflexivos ou refratários à frugalidade moderna que, indevidamente, acabam sendo aconselhados a procurar “ajuda especializada”, algum tratamento para que se iguale aos seus pares efusivos.
O mesmo engano se comete em relação ao cansaço natural, proporcionado pelas dificuldades da lida com a vida moderna normal. A exposição da pessoa ao desencanto da vida em sociedade, principalmente nesta nossa sociedade insegura e cheia de inversões de valores, a tristeza estimulada por tantas notícias absurdamente bizarras, enfim, essa grande variedade de frustrações impostas às pessoas por viver em um sistema como o nosso, costuma ser equivocadamente interpretado como Depressão, uma patologia dentro dos transtornos afetivos. Na realidade pode se tratar de um estado de frustração e desencanto com sintomatologia bastante semelhante à depressão.
Pela semelhança dos sintomas tais como apatia, desânimo, desinteresse, sensação de cansaço, pode ter também ansiedade, prostração, abatimento intelectual, moral, físico, letargia, estresse, melancolia, a depressão acaba sendo uma espécie de irmã gêmea da frustração. Na frustração, pela falta de um objeto (ou situação) pleiteado ou por um obstáculo externo ou interno não superado, a pessoa se priva da satisfação de um desejo, de um anseio ou de uma necessidade.
Esse distanciamento do prazer proporcionado pela frustração se assemelha, de fato, à Depressão. Mas a frustração é predominantemente existencial e a Depressão é predominantemente constitucional ou biológica. Sendo a frustração predominantemente existencial, supõe-se ser possível adaptar-se de alguma forma a ela, comportamentalmente ou cognitivamente. Assim sendo, frustrações são importantes para que as crianças aprendam a lidar melhor com privações de desejos, de prazeres, de caprichos ...
É correto acreditar que a pessoa frustrada está muito mais sujeita a deprimir-se do que a pessoa sem frustração, pois, tal como uma Reação Vivencial (veja ao lado), os sintomas depressivos, incluindo a tristeza, seriam as reações emocionais diante da frustração. Da mesma forma, o inverso é verdadeiro, uma pessoa deprimida terá frustrações com mais facilidade, pois a sensibilidade afetiva dos deprimidos torna mais sofríveis e tristes as perdas vivenciais.
As pessoas com perfil afetivo mais depressivo são aquelas que, geralmente, têm baixa tolerância à frustração, são rígidas e inflexíveis em seus valores, estabelecem metas difíceis para si mesmas. São intransigentes com elas mesmas e em seus julgamentos, experimentam culpa e se impõem sofrimentos.
Mas os fenômenos não são os mesmos; tristeza, aborrecimento, frustração, estado depressivo ou reação depressiva são circunstâncias afetivas reativas diferentes do Transtorno Depressivo. E esse será o xis da questão. Será que a população de deprimidos biológicos está aumentando assustadoramente por razões desconhecidas ou, será que as frustrações proporcionadas pela vida cotidiana têm resultado em maior número de pessoas com estado depressivo?
Seria, talvez, bastante prudente começar a diferenciar os quadros com sintomas depressivos semelhantes mas de origem diferente. Hoje, praticamente todo estado depressivo se inclui dentro do diagnóstico de Transtorno Depressivo. E a ascensão estatística desse diagnóstico é assustador, inclusive em crianças e adolescentes.
Depressão e Frustração na Infância
O interesse científico pela depressão em crianças e adolescentes aumentou depois da década de 70, quando até então se acreditava que fosse rara ou inexistente. Atualmente a depressão maior em crianças e em adolescentes é considerada comum, debilitante e recorrente, envolvendo um alto grau de morbidade e mortalidade, representando um sério problema de saúde pública (Bahls, 2002) .
Em crianças pré-escolares, até a idade de seis a sete anos, a depressão é representada por sintomas físicos, tais como dores (principalmente de cabeça e abdominais), fadiga e tontura em 70% dos casos Goodyer (1996). Em segundo lugar, depois das queixas físicas, a depressão infantil se manifesta por sintomas relacionados à ansiedade, especialmente ansiedade de separação, fobias, hiperatividade, irritabilidade, diminuição do apetite com falha em alcançar o peso adequado e alterações do sono.
Entre esses sintomas da depressão infantil destaca-se a perda do prazer de brincar ou ir para a pré-escola, escola quando for o caso ou outros cursos de habilidades para cada idade (natação, balet, capoeira, futebol, ginástica olímpica, línguas estrangeiras, informática, piano, etc, etc, etc).
Uma questão intrigante seria saber se os próprios compromissos impostos às crianças não seriam estressores suficientemente fortes para gerar as tensões necessárias à sintomatologia depressiva. Não bastasse o próprio empenho existencial para dar conta desse rol de compromissos, ainda existe a inegável e dissimulada expectativa opressora dos pais por resultados nunca menos que brilhantes.
É claro que, cientificamente, devemos respeito às observações de alguns autores, como de Bhatara (1992) por exemplo, segundo o qual, tanto em crianças pré-escolares como nas escolares a depressão pode tornar-se clara através da observação dos temas com conteúdos predominantes de fracasso, frustração, perdas, culpa e excesso de autocríticas. Mas, insistimos em questionar, não poderia ser o contrário? A sintomatologia depressiva não poderia surgir como conseqüência dessas vivências frustrantes.
Também em relação aos adolescentes. Adolescentes deprimidos, como se sabe há tempos, não estão sempre tristes. É mais comum que seus sintomas depressivos façam com que estejam principalmente irritáveis, instáveis, com crises de explosão e raiva.  Mais de 80% dos jovens deprimidos apresentam, além do humor irritado, perda de energia, apatia, desinteresse, sentimentos de desesperança e culpa (Kazdin & Marciano, 1998).
Esse quadro do adolescente pode igualmente ser tido como reflexo de altíssimo grau de aborrecimento e frustração, seja pelo descontentamento com aspectos corporais, com a identidade, com a popularidade, com o relacionamento amoroso, seja pela simples falta de perspectivas existenciais ou pela não aquisição de bens de consumo estimulada pela propaganda.
Em nosso meio, o jovem universitário começa a se frustrar quando percebe a grande incerteza em um futuro promissor concordante com sua vocação ou com o curso a que se dedica, entre muitos outros aborrecimentos. É a síndrome de final do curso.
É claro que nenhum psiquiatra de bom senso negaria a prescrição de antidepressivos para crianças e adolescentes com franca sintomatologia depressiva, porém, seria muito comodismo social acreditarmos que o problema estará assim resolvido. A qualidade existencial e social parece não ser questionada adequadamente.
Depressão e Frustração: Estabelecer Diferenças
Mas independentemente de se tratar da infância ou adolescência, é importante destacar que a dinâmica depressiva pode se instalar em qualquer época da vida, dependendo da intensidade dos fatores desencadeantes, da sensibilidade afetiva da pessoa bem como de seu potencial constitucional (genético).
Todo esse raciocínio nos faz crer, ou melhor, nos faz deduzir que quando a pessoa não consegue suportar as pressões internas, como conflitos, por exemplo, ou externas, como as exigências vivenciais a depressão encontra seu campo fértil. Entretanto, o que tem nos preocupado é saber se essas exigências vivenciais não têm superado o limiar de adaptação de pessoas afetivamente normais e, nelas, apesar da normalidade psíquica, desencadeado estados depressivos. Não chamaria isso de Doença Depressiva.
Tem sido bastante freqüente na clínica diária, pessoas emocionalmente normais, com antecedentes emocionais absolutamente sadios e que, ao se depararem com as tensões do cotidiano (competitividade, violência, insegurança, doenças graves, etc) acabam invadidas por pensamentos de culpa, abandono, medo, impotência, angústia ou até mesmo de natureza mais grave, como por exemplo, perseguição, delírios e alucinações. Trata-se no máximo de um Estado Depressivo e não de um Transtorno Depressivo, trata-se de uma reação emocional depressiva e de acordo com a frustração, algo  possível e bastante provável acontecer a qualquer pessoa, mesmo que não tenha antecedentes psiquiátricos.
Os sintomas são, realmente, muito semelhantes entre a frustração que acomete a sociedade cada vez mais freqüentemente e os sintomas da Doença Depressiva, entre os quais, o rebaixamento da auto-estima, sensação de culpa pelo fracasso, pessimismo, exagero na seriedade dos problemas, redução da motivação. É muito difícil, hoje em dia, uma pessoa normal atravessar sua existência sem ter tido algum período da vida sintomas como esses. E aí, como fica essa questão: todas as pessoas que se sentem assim estão com Transtorno Depressivo? Devem receber tratamento especializado?
A importância da questão conceitual (frustração ou Doença Depressiva) faz lembrar o conto de Machado de Assis, O Alienista, quando o psiquiatra, personagem central da estória, se depara com um problema crucial: a maioria dos habitantes de sua cidade preenchia critérios de diagnóstico para alguma doença mental. Se a maioria parecia ter alguma doença, então, ter alguma doença era normal e anormal seria quem se destacava da maioria, ou seja, aqueles que não tinham nenhum sintoma. Entre esses, ele próprio se encaixava.
Importância da Frustração
Alguns autores estudam a importância da capacidade de adiar as gratificações e suportar a frustração para o desenvolvimento sadio da criança. Para Cassorla (1992), a criança adquire capacidade de pensar a partir de uma frustração, de uma falta, de um sentimento, mas alerta para o fato de que essa frustração deva ser suportável para o bebê, ou terá efeito negativo no desenvolvimento.
Se estiver certa a idéia de que a pessoa precisa experimentar frustrações durante o desenvolvimento infanto-juvenil para melhor se adaptar à realidade existencial da vida adulta, então as facilidades, benevolências, ausência de limites e hiper-atendimento das necessidades que os pais atualmente proporcionam aos filhos estariam contribuindo para uma deficiência adaptativa de futuras gerações.
A falta de preparo para suportar e superar frustrações na infância pode aumentar ainda mais a inclinação hedonista no futuro, crises emocionais desencadeadas por contrariedades pequenas, insatisfações crônicas.
A frustração é um sentimento de não-realização ou não-satisfação diante de um destino que se distancia da vontade. Aí, o mais correto seria chamar o quadro de tristeza, mágoa, aborrecimento, desespero. A criança também se desespera diante das dificuldades da vida e manifesta frustrações. E talvez esse evento seja fundamental para o desenvolvimento emocional, muito mais importante do que a privação total de frustrações proporcionada por pais super protetores.
Compete ao bom observador a dificílima tarefa de diferenciar se a criança está deprimida ou frustrada. Os sintomas entre esses dois estados podem ser muito semelhantes, mas a origem e, principalmente, o conceito são diferentes. Levar um fora do namorado, perder um passeio previamente programado, ter que mudar de cidade ou de escola pode gerar frustrações, mágoas, tristezas, enfim, pode exaurir a capacidade de adaptação. É diferente da Depressão, que acomete a pessoa sem uma causa aparente ou proporcional. 
Tratar a Frustração?
Chamo de Tonalidade Afetiva a sensibilidade da pessoa diante de suas vivências. Isso envolve o limiar de cada um para suportar ou superar a dor, o sofrimento, a frustração, os conflitos e os complexos, tal com uma capacidade adaptativa satisfatória, sem que algo emocionalmente mais grave aconteça. Esse limite está, desta forma, diretamente relacionado à nossa Tonalidade ou Perfil Afetivo.
No caso do Transtorno Afetivo, tipo Depressão, perde-se a capacidade adaptativa e, além do extremo mal estar emocional, verifica-se que o conjunto de valores pessoais e aceitos até o momento, não são mais suficientes para aliviar nossas inquietações interiores, levando ao adoecimento afetivo.
Nos casos de Transtorno Depressivo deve-se muito à psiquiatria clínica, por conta dos antidepressivos, dos ansiolíticos, capazes de melhorar bastante a qualidade de vida desses pacientes. O uso de medicamentos nesses casos de Transtorno Depressivo é altamente recomendável.
Entretanto, se a sintomatologia, apesar de depressiva, resultar das dores emocionais das frustrações, das perdas, dos desencantos, das desesperanças..., apesar do alívio paliativo do sofrimento proporcionado pelos medicamentos, quando forem usados como única atitude terapêutica poderão apenas amortizar os sentimentos naturais das vivências frustrantes, mas não solucionarão a questão.
Pensando na utilização cada vez mais freqüente dos antidepressivos, havendo já várias famílias onde mais de um integrante toma esses medicamentos e sabendo-se da enorme quantidade que se vende mundialmente desses produtos, alguma reflexão deve ser estimulada:
- Será que a tendência do ser humano, filogeneticamente falando, é vir a ser uma espécie onde o nível de serotonina ou qualquer outro neurotransmissor envolvido na depressão é fisiologicamente insuficiente para a vida em sociedade?
- Será que a tendência da sociedade humana é evoluir para uma situação onde os recursos naturais e fisiológicos do Sistema Nervoso do ser humano serão insuficientes?
Na realidade o que intriga é saber o que pode estar errado: a capacidade de adaptação ou a necessidade de adaptação humana à sua própria sociedade? Será insuficiente a capacidade ou será exagerada a necessidade de adaptação? O que se tem de concreto, pelo menos aparentemente, é que o ser humano normal tem tido que fazer uso de antidepressivos para melhorar sua qualidade de vida emocional.
Tem sido cada vez mais comum situações onde, por causa de um Episódio Depressivo, uma Síndrome do Pânico ou uma Somatização ou outro quadro agudo, pessoas tenham iniciado tratamento com antidepressivos e relutem em parar de usá-los. Não se trata de síndrome de abstinência, mas sim da piora na qualidade de vida emocional e de relação quando ficam sem o antidepressivo.
Em uma cultura que se sustenta no culto ao prazer, podem ser tênues os limites entre a indicação médica de medicamentos que suprimem a dor e a angústia próprias da doença depressiva e o uso indiscriminado desses produtos como lenitivo das frustrações cotidianas. Outras drogas que entorpecem, euforizam e enebriam passam a servir como provedoras de uma felicidade e bem estar artificialmente produzido.
Assim como a pesquisa científica neuropsíquica vem se desenvolvendo nas últimas décadas, principalmente em relação à neurofisiologia e neuroquímica, também as técnicas terapêuticas devem ser estimuladas e novas abordagens devem ser pesquisadas para atuarem, com ou sem indicação de medicamentos, da melhor forma possível nos sofrimentos por frustração, por injúria existencial.
Mas esse assunto, o da qualidade existencial humana, ultrapassa em muito a área da medicina, da psiquiatria e da psicologia. Este é um tema que fortemente diz respeito à sociologia, à antropologia e, principalmente, à política e à economia. Estes outros segmentos da sociedade devem ser envolvidos nessa questão. Programas sócio-políticos devem prever o conforto emocional das pessoas, devem, sobretudo, oferecer sensação justiça e de segurança suficientes para afastar a desesperança atual, devem buscar a estabilidade econômica para proporcionar dignidade, auto-estima e perspectivas otimistas e assim por diante.

Ballone GJ - Depressão e Frustração - in. PsiqWeb, Internet, disponível em www.psiqweb.med.br, 2006