Ansiedade, Estresse e Esgotamento são termos de uso corrente entre as pessoas participantes daquilo que se chama vida moderna. Ninguém gosta de pensar na Ansiedade, no Estresse, no Esgotamento ou na Depressão
como sendo formas de algum transtorno mental, é claro. Isso pode
parecer muito próximo do descontrole, da piração ou da loucura e, diante
da possibilidade de sermos afetados, pelo menos alguma vez na vida,
pelo Estresse, pelo Esgotamento ou pela Depressão, então será melhor não considerá-los como formas de algum transtorno emocional.
Devemos considerar o Estresse uma
ocorrência fisiológica e normal no reino animal. O Estresse é a atitude
biológica necessária para a adaptação do organismo à uma nova situação.
Em medicina entende-se o Estresse como uma
ocorrência fisiológica global, tanto do ponto de vista físico quanto do
ponto de vista emocional. As primeiras pesquisas médicas sobre o Estresse estudaram toda uma constelação de alterações orgânicas produzidas no organismo diante de uma situação de agressão.
Fisicamente o Estresse aparece quando o
organismo é submetido à uma nova situação, como uma cirurgia ou uma
infecção, por exemplo, ou, do ponto de vista psicoemocional, quando há
uma situação percebida como de ameaça.
De qualquer forma, trata-se de um organismo submetido à uma situação
nova (física ou psíquica), pela qual ele terá de lutar e adaptar-se,
conseqüentemente, terá de superar. Portanto, o Estresse é um mecanismo indispensável para a manutenção da adaptação à vida, indispensável pois, à sobrevivência.
Do ponto de vista psíquico o Estresse se traduz na Ansiedade. A Ansiedade
é, assim, uma atitude fisiológica (normal) responsável pela adaptação
do organismo às situações de perigo. Vejamos, por exemplo, as mudanças
acontecidas em nossa performance física quando um cachorro feroz tenta
nos atacar, quando fugimos de um incêndio, quando passamos apuros no
trânsito, quando tentam nos agredir e assim por diante.
De frente para o perigo nossa performance física faz coisas
extraordinárias, coisas que normalmente não seríamos capazes de fazer em
situações mais calmas. Se não existisse esse mecanismo que nos coloca
em posição de alerta ou alarme, talvez nossa espécie nem teria
sobrevivido às adversidades encontradas pelos nossos ancestrais.Embora a
Ansiedade favoreça a performance e a
adaptação, ela o faz somente até certo ponto, até que nosso organismo
atinja um máximo de eficiência.
À partir de um ponto excedente a Ansiedade,
ao invés de contribuir para a adaptação, concorrerá exatamente para o
contrário, ou seja, para a falência da capacidade adaptativa. Nesse
ponto crítico, onde a Ansiedade foi tanta que
já não favorece a adaptação, ocorre o esgotamento da capacidade
adaptativa. Vejamos ao lado, a ilustração de um gráfico hipotético, onde
teríamos um aumento da adaptação proporcional ao aumento da Ansiedade
até um ponto máximo, com plena capacidade adaptativa. A partir desse
ponto o desempenho ou adaptação cai vertiginosamente. Aí se caracteriza o
Esgotamento.
Em nossos ancestrais esse mecanismo foi destinado à sobrevivência
diante dos perigos concretos e próprios da luta pela vida, como foi o
caso das ameaças de animais ferozes, das guerras tribais, das
intempéries climáticas, da busca pelo alimento, da luta pelo espaço
geográfico, etc.
No ser humano moderno, apesar dessas ameaças concretas não mais
existirem em sua plenitude tal como existiram outrora, esse equipamento
biológico continuou existindo. Apesar dos perigos primitivos e concretos
não existirem mais com a mesma freqüência, persistiu em nossa natureza a
capacidade de reagirmos ansiosamente diante das ameaças.
Com a civilidade do ser humano outros perigos apareceram e ocuparam o
lugar daqueles que estressavam nossos ancestrais arqueológicos. Hoje em
dia tememos a competitividade social, a segurança social, a competência
profissional, a sobrevivência econômica, as perspectivas futuras e mais
uma infinidade de ameaças abstratas e reais, enfim, tudo isso passou a
ter o mesmo significado de ameaça e de perigo que as questões de pura
sobrevivência à vida animal ameaçavam nossos ancestrais. Se na
antigüidade tais ameaças eram concretas e a pessoa tinha um determinado
objeto real à combater (fugir ou atacar), localizável no tempo e no
espaço, hoje em dia esse objeto de perigo vive dentro de nós. As ameaças
vivem, dormem e acordam conosco.
Se, em épocas primitivas o coração palpitava, a respiração ofegava e a
pele transpirava diante de um animal feroz a nos atacar, se ficávamos
estressados diante da invasão de uma tribo inimiga, hoje em dia nosso
coração bate mais forte diante do desemprego, dos preços altos, das
dificuldades para educação dos filhos, das perspectivas de um futuro
sombrio, dos muitos compromissos econômicos cotidianos e assim por
diante. Como se vê, hoje nossa Ansiedade é continuada e crônica. Se a adrenalina antes aumentava só de vez em quando, hoje ela está aumentada quase diariamente.
A Ansiedade aparece em nossa vida como um
sentimento de apreensão, uma sensação de que algo está para acontecer,
ela representa um contínuo estado de alerta e uma constante pressa em
terminar as coisas que ainda nem começamos. Desse jeito nosso domingo
têm uma apreensão de segunda-feira e a pessoa antes de dormir já pensa
em tudo que terá de fazer quando o dia amanhecer. É a corrida para não
deixar nada para trás, além de nossos concorrentes. É um estado de
alarme contínuo e uma prontidão para o que der e vier.
As férias são tranqüilas e festivas apenas nos primeiros dias mas,
logo em seguida, começamos a nos agitar: ou porque sentimos que não
estamos fazendo alguma coisa que deveríamos fazer, embora não saibamos
bem o que, ou porque pensamos em tudo aquilo que teremos de fazer quando
as férias terminarem.
A natureza foi generosa oferecendo-nos a atitude da Ansiedade ou Estresse,
no sentido de favorecer sempre a adaptação. Porém, não havendo período
suficiente para a recuperação desse esforço psíquico, o qual
restabeleceria a saúde, ou persistindo continuadamente os estímulos de
ameaça que desencadeiam a reação de Estresse, nossos recursos para a adaptação acabam por esgotar-se. O Esgotamento é, como diz o próprio nome, um estado onde nossas reservas de recursos para a adaptação se acabam.
Organicamente, no Esgotamento, há alterações significativas nas glândulas supra-renais
(produtoras de de adrenalina e cortisona), há dificuldades no controle
da pressão arterial, há alterações do ritmo cardíaco, alterações no
sistema imunológico, no controle dos níveis de glicose do sangue, entre
muitas outras. Psiquicamente a Ansiedade crônica ou Esgotamento leva à um estado de apatia, desinteresse, desânimo e de pessimismo em relação à vida.
Os sintomas mais comuns da ansiedade podem ser listados como abaixo
e, normalmente costumam estar relacionados à estresse ambiental crônico,
têm um curso flutuante, variável e tendência à cronificação.
SINTOMAS ASSOCIADOS À ANSIEDADE CRÔNICA
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01 - tremores ou sensação de fraqueza
02 - tensão ou dor muscular
03 - inquietação
04 - fadiga fácil
05 - falta de ar ou sensação de fôlego curto
06 - palpitações
07 - sudorese, mãos frias e úmidas
08 - boca seca
09 - vertigens e tonturas
10 - náuseas e diarréia
11 - rubor ou calafrios
12 - polaciúria (aumento de número de urinadas)
13 - bolo na garganta
14 - impaciência
15 - resposta exagerada à surpresa
16 - dificuldade de concentração ou memória prejudicada
17 - dificuldade em conciliar e manter o sono
18 - irritabilidade
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O Esgotamento tem origem em duas ocasiões:
1. - Primeiro, quando a situação à qual o indivíduo terá que adaptar-se (estímulo externo ou interno) exigir intensa participação emocional e persistir continuadamente. Nesse caso há um esgotamento por falência adaptativa devido aos esforços (emocionais) para superar uma situação persistente. Isso quer dizer que o estímulo para o estresse seria ameaçador tanto para a pessoa que à ele reage, quanto para outras pessoas submetidas ao mesmo estímulo.
2. - Em segundo lugar, quando a pessoa não dispõe de uma estabilidade emocional suficientemente adequada para adaptar-se à estímulos não tão traumáticos, objetivamente falando. Isso quer dizer que a pessoa sucumbiria emocionalmente à situações não tão agressivas à outras pessoas colocados na mesma situação mas, não obstante, agressivas particularmente à ela.
Digamos, então, que o esgotamento ou a ansiedade crônica e patológica
poderia surgir diante de duas circunstâncias: decorrente daquilo que o
mundo traz à pessoa (Agentes Ocasionais) ou, por outro lado, decorrente daquilo que a pessoa traz ao mundo (Disposições Pessoais).
A primeira representada pelo destino da pessoa e a segunda pelo seu
perfil afetivo. Não obstante, o destino poderá modelar determinadas
formas de valorizar a realidade em grande número de pessoas
Estímulos que Produzem Ansiedade e, conseqüentemente, EstresseSe
hoje sabemos muito sobre o Estresse e a Ansiedade, tanto do ponto de
vista comportamental quanto neuroquímico, pouco sabemos ainda sobre seu
aspecto principal ou primordial. Pouco sabemos sobre esse tal estímulo
desencadeador ou estressor. É por aí onde tudo começa, ou seja, todas as
reações orgânicas, as atitudes, emoções, comportamentos, alterações
químicas fisiológicas, etc e tal, começam sempre à partir do tal
estímulo.
Conforme já comentamos, a Ansiedade e o Estresse
não são monopólio do ser humano. Se colocarmos um gato junto de um cão
num espaço fechado, depois de algum tempo esse gato estará Esgotado;
primeiro ele terá muita Ansiedade, entrará em Estresse e, pela
continuidade do estímulo agressivo (presença do cão) se esgotará.
Tendo em vista o fato do gato representar para o cão uma ameaça menos
agressiva que o cão representa para o gato, o cão ficará esgotado
depois do gato. Nesse caso o cão representa para o gato um estímulo
agressivo: externo, por estar fora do gato e, inato, por fazer parte da
natureza biológica de todos os gatos.
Quadro 2 – ORIGEM E NATUREZA DOS ESTRESSORES
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Nos Animais
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Nos Seres Humanos
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Origem
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Natureza
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Origem
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Natureza
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Externos
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Condicionados
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Externos
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Adversidades
Conflitos
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Internos
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Inatos
|
Internos
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Transtornos Afetivos
Traços de Personalidade
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Assim sendo, nos animais os estímulos para desencadear-se a Ansiedade
também podem ter duas origens: quanto à natureza eles podem ser inatos,
como vimos, do tipo gato tem medo de cachorro ou, de outra forma,
condicionados por treinamento e experiência. Quanto à origem serão
internos, caso se trate de instintos e externos, quando for o caso do
treinamento ou condicionamento (veja Quadro 2 acima).
No ser humano dito civilizado, esses estímulos também costumam ter
duas origens; podem ser externos e internos. Os estímulos internos são
oriundos dos conflitos íntimos. Os estímulos externos, por sua vez,
representam as ameaças concretas do cotidiano de cada um.
Nossa capacidade de conhecer o mundo proporciona uma percepção
pessoal da realidade. Essa percepção pessoal da realidade, diferente em
cada um de nós, é chamada de procepção da realidade. A principal idéia
que devemos ter disso é que a realidade será sempre representada
intimamente e de acordo com a personalidade de cada um.
Essa percepção pessoal da realidade engloba
toda nossa maneira de ver e sentir o mundo. Engloba não apenas a
concepção que temos das coisas que estão fora da gente, como é o mundo
objectual, como também os conceitos que temos dentro de nós. Isso inclui
a imagem que temos de nós mesmos, ou seja, inclui nossa própria auto-estima.
Nossa auto-estima pode ser representada
favoravelmente ou não, de acordo com a tonalidade afetiva de cada um.
Algumas pessoas se vêem ótimos, outras se vêem péssimos. Assim sendo, a
idéia que nós temos de nós mesmos pode ser um estímulo agressivo e
causador de Ansiedade, caso seja uma idéia a nos perturbar constantemente.
É por causa desses estímulos internos que a Ansiedade
humana tem sido constante e às vezes patológica. As ameaças externas
não costumam ser tão constantes quanto as internas. Vejamos o caso das
ameaças concretas acerca de nossa segurança pessoal, por exemplo: a
ameaça de ser assaltados, agredidos, morto, etc. Possibilidades até
existem, nos grandes centros, mas normalmente não é continuada. Há
situações onde podemos nos sentir seguros, racionalmente falando. Por
outro lado, o estímulo interno não é racional, é emocional. Isso quer
dizer que podemos estar ansiosos devido ao medo de sermos assaltados,
agredidos, humilhados, demitidos, etc., embora tais possibilidades sejam
mínimas na prática.
Da mesma forma, podemos dizer que ficar doente seja uma ameaça séria,
um estímulo ameaçador importante. É claro que é. Entretanto, podemos
experimentar uma grande Ansiedade devido ao
fato de pensarmos que podemos ficar doentes. Esse estímulo já é interno e
não externo. Seria externo caso houvesse, de fato, sinais de que nossa
saúde foi abalada. Enquanto houver apenas o medo de passar mal, de poder
ficar doente, isso será uma ameaça interna.
Ora, enquanto nos animais os estímulos agressivos externos aparecem
periodicamente, no ser humano a presença dos estímulos internos pode ser
continuada. Havendo uma afetividade problemática, insegurança e
pessimismo, vamos sentir ameaças internas continuadamente. Vamos dormir
com essas ameaças e acordar com elas. Portanto, nessas circunstâncias
podemos ter o Esgotamento.
Psicologicamente, para o ser humano a agressão depende mais do agente
agredido que do agente agressor. Isso quer dizer que o estímulo para
desencadear a Ansiedade depende, no mais das
vezes, mais da sensibilidade da pessoa do que do estímulo propriamente
dito. Para uma pessoa claustrofóbica, estar num elevador não significa
simplesmente estar objetivamente num elevador.
Será a Personalidade de cada um quem, de fato, atribuirá
valores e significados aos acontecimentos, tomando-os ou não por
estressantes, angustiantes, temerosos, ameaçadores e assim por diante.
Um Ego funcionando adequadamente é capaz de prover a adaptação
necessária entre o mundo externo e interno, ou entre o indivíduo e seu
ambiente, ou, finalmente, entre o ser e seu destino. Sempre que houver
fragilidade desse Ego, haverá comprometimento na adaptação e desequilíbrio entre o ser e o mundo ou, resumindo, haverá uma Ansiedade crônica.
Como vimos acima, os estímulos capazes de proporcionar a Ansiedade
podem ser externos, denominados geralmente de circunstanciais e
interpessoais, representados pelo embate entre as forças opressoras do
ambiente e as condições da pessoa. Mesmo em se tratando de estímulos
externos, provenientes do mundo objetivo, sua natureza agressiva poderá
ser mais traumática ou menos traumática, dependendo da conotação à ele
atribuída por nossa pessoa. Os estímulos podem ainda ser internos,
denominados intrapsíquicos, onde se situam os Conflitos pessoais da pessoa normal ou os transtornos afetivos e traços ansiosos de personalidade nas pessoas mais problemáticas.
A existência dos Conflitos pode ser considerada fisiológica
na espécie humana, ou seja, eles existem em todos nós e parecem ser
essenciais ao desenvolvimento da Ansiedade. Em nosso cotidiano, sem termos plena consciência, experimentamos um sem-número de pequenos Conflitos,
interpessoais ou intrapsíquicos; as tensões entre ir e não ir, fazer e
não fazer, querer e não poder, dever e não querer, querer, poder e não
dever, a assim por diante.
Finalmente, devemos entender que os estímulos necessários para determinar a Ansiedade
são proveniente de duas origens: são externos, quando se devem à
sucessão de acontecimentos de nossa vida aos quais temos que nos adaptar
e internos, quando se originam dentro de nós mesmos, de nossos medos,
nossos pensamentos negativos, nossas inseguranças. No ser humano os
estímulos produtores de Ansiedade costumam
ser, predominantemente, de origem interna e pessoal, decorrentes da
valoração individual que a pessoa atribui à sua realidade e aos fatos
com os quais se depara
para referir:
Ballone GJ, Moura EC -Ansiedade, Esgotamento e Estresse - in. PsiqWeb, Internet, disponível em www.psiqweb.med.br, revisto em 2008.