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quarta-feira, 28 de março de 2012

Reflexões Sobre a Transição Paradigmática em Saúde Mental

Os autores sugerem a substituição do modelo em vigor por um outro que se oriente para uma perspectiva que busque preservar a liberdade do paciente e o caráter relacional da expressividade humana.
Há uma problemática atingindo todas as camadas sociais, que se traduz em desconforto para os usuários do sistema de saúde, revoltas, aumento do número de óbitos por falta de assistência e aos profissionais de área, que se vêem impotentes diante da demanda.
A mudança de paradigma na assistência à saúde mental faz-se necessária e traz em seu bojo a convicção da necessidade de formulação de outros modelos conceituais, além da reformulação das próprias instituições, principalmente aquelas que lidam com o doente mental e implicam a implementação de uma nova política de saúde. Esta perceptiva deve oferecer alternativas de ação compatíveis com a realidade concreta das instituições e do país.

Compreendendo o Conceito Paradigma


Mas o que vem a ser paradigma?

É toda uma estrutura conceitual e operacional de que dispõe uma determinada comunidade cientifica no exercício de sua atividade. São os elementos básicos, fundamentais compartilhados por membros de uma ciência ou por profissionais que no exercício de suas práticas adotam princípios comuns.
Os paradigmas estão diretamente ligados a determinadas visões de mundo da comunidade científica, e determinam ações e estratégias terapêuticas e de prevenção. Durante um período de tempo detectam problemas e sugerem soluções modelares para uma comunidade.
Em outras palavras, paradigma refere-se a modelo, padrão e vivências compartilhadas, configurando-se em um esquema exemplar de descrições e compreensão da realidade.
O paradigma entra em crise quando há fracasso na solução dos problemas por ele propostos, abalando a crença em suas próprias regras e padrões conceituais. O fracasso nas regras existentes é o prelúdio para a busca de novas alternativas.

Saúde Mental e a Necessidade de Novos Paradigmas


Durante anos a Psiquiatria lutou sem limites para ser admitida como especialidade médica.
Se por um lado houve um avanço enorme, principalmente na tecnologia aplicada aos exames diagnósticos, como a tomografia computadorizada e cirurgias a laser, por outro lado, este modelo revelou-se obscuro e ambíguo na abordagem dos problemas emocionais e de conduta, não consolidando sua teoria, nem apresentando significativas soluções.
Embora atualmente, o paradigma que predomina na área da saúde mental é ainda o do modelo médico, as referências e conceitos que permeiam a assistência psiquiátrica está emitindo sinais de esgotamento, pois todo progresso teórico e tecnológico tem se revertido num paradoxo, de cirurgias e medicamentos altamente sofisticados e altíssimo custo, à assistência precária e insuficiente para a grande maioria da população, consubstanciada por uma prática repressiva, cronificada e estigmatizada, que não atende às necessidade do doente.
O baixo índice de resolutividade, o encarceramento improdutivo dos esquizofrênicos crônicos, a reprodução das doenças mentais, a pressão da demanda em nível da população, todos esses fatores reforçam e confirmam a necessidade da emergência de novos paradigmas, com novos modelos de assistência.     

Contribuição à Reflexão Rumo a um Novo Paradigma


Diante do que foi exposto, verifica-se a necessidade da adoção de estratégias de desinstitucionalização e novos paradigmas grupais e institucionais, como oficinas terapêuticas, que busquem regatar a cidadania do doente mental.
E fundamental que o hospital psiquiátrico, a equipe técnica, a clientela e a interdisciplinaridade, articulem-se para a construção de um novo paradigma. Esse novo paradigma deve ter uma atitude de cidadania e uma nova estratégia terapêutica, onde segundo Silveira, “as sensações, emoções e pensamentos são levados a reconhecer-se, a associar-se”.
Questiona-se a relação médico-paciente, onde predomina uma visão estritamente organicista da loucura e não questiona, naturalmente, a relação sujeito-objeto de conhecimento. Essa é certamente uma relação de poder.
Para Foucault a psico-cirurgia e a psiquiatria farmacológica modernas podem visar à redução do poder do médico aos sintomas mínimos da doença, ao contrário de sua produção ou exacerbação – como nos tratamentos de Charcot -, mas não contestam esse poder que lhes é conferido pelo “conhecimento objetivo”.
A psicanálise entende que os sintomas expressam o sentido da doença e procura intensifica-los em uma relação eqüitativa médico-paciente. Ao médico cabe apenas escutar o paciente e servir de apoio para a transferência dos conflitos inconscientes do paciente, e dessa forma, torna-los conscientes nessa relação e que por fim o paciente possa assumir o destino de sua vida.
A psicanálise contrapõe-se à psiquiatria clássica porque entende que o paciente deve assumir os conflitos expressos em seus sintomas, ao invés de simplesmente elimina-los através de fármacos e intervenções fármacos.
Foucault vislumbra no movimento antipsiquiatria a contestação do par sujeito-objeto no conhecimento da loucura e pergunta-se: Se a loucura pode ser tratada não em nome de um saber, mas no reconhecimento da alteridade do louco ou de sua experiência. 
Já a psiquiatria existencial, fundada na analítica heideggeriana do Dasein, rompe com as categorias da metafísica clássica, que parecer ser a direção fundamental da transição paradigmática no tratamento da loucura ou das desordens mentais. A analítica revela o homem como ser no mundo, e a loucura nesse sentido, só pode ser entendida a uma só vez como um desarranjo da existência do homem e uma forma característica de existir: ela tem sempre um sentido porque representa uma forma de projeção do homem no mundo.
Merleua-Ponty, expressou a necessidade de uma reforma das categorias da metafísica clássica para a compreensão das relações entre o somático e o psíquico. Concebendo a projeção do corpo na relação de sentido como o mundo (recusando, portanto, a concepção mecanicista de corpo), torna a existência acessível à doença tanto a partir dos sentidos vividos, quanto a partir do desarranjo do próprio corpo nessa relação.
Não se pode fechar as portas para outras ciências nessa busca por uma nova estrutura no tratamento dos doentes mentais.

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