O
consumo de álcool no Brasil supera a média mundial e apresenta taxas
superiores a mais de 140 países. Os dados são da Organização Mundial da
Saúde (OMS) que, em um informe publicado nesta segunda-feira, 12,
alertou que 3,3 milhões de mortes no mundo em 2012 (5,9% do total) foram
causadas pelo uso excessivo do álcool. O volume é superior a todas as
vítimas causadas pela aids e tuberculose.
Segundo a entidade, a bebida pode não só criar dependência, mas também leva ao desenvolvimento de outras 200 doenças.
A OMS avaliou dados de 194 países e chegou à
conclusão de que o consumo médio mundial para pessoas acima de 15 anos é
de 6,2 litros por ano. No caso do Brasil, os dados apontam que o
consumo médio é de 8,7 litros por pessoa por ano. Esse volume caiu entre
2003 e 2010. Há dez anos, a taxa era de 9,8 litros por pessoa.
Hoje, entre os países avaliados, o Brasil ocupa a
53.ª posição entre os que mais consomem álcool. A liderança é da
Bielorrússia, onde o consumo anual per capita chega a 17,5 litros, duas
vezes o volume brasileiro. Mas as projeções até 2025 mostram que o
consumo no Brasil voltará a aumentar, ultrapassando a marca de 10,1
litros por ano por pessoa. Em 1985, o índice não chegava a 4 litros.
No caso brasileiro, a diferença entre o consumo
masculino e feminino é profunda. Entre os homens, a taxa chega a mais de
13 litros por ano. Para as mulheres, ela é de 4 litros. Cerca de 60% do
consumo é de cerveja; apenas 4% é representado pelo vinho.
Mas o que mais preocupa a OMS são os casos de
abusos no consumo. No mundo, a média é de 7,5% da população que
experimentou em algum momento do ano consumo excessivo de álcool. No
Brasil, porém, a taxa de pessoas que participam de episódios de consumo
pesado é de 12,5%. Em um ranking de números de anos perdidos de vida
saudável, o Brasil está entre os líderes.
Entre a população brasileira que bebe, um terço
identificou que já abusou do álcool em alguma ocasião. A taxa é bem
superior à média mundial, de 16%.
Os dados revelam que são as classes
mais pobres que mais sofrem com o impacto social e de saúde do álcool.
"Elas frequentemente carecem de cuidados à saúde de qualidade e são
menos protegidas por redes funcionais de família e comunidade", disse
Shekhar Saxena, diretor de saúde mental e abuso de substâncias da OMS.
Um
comercial de TV dos anos 1990 trouxe um dos primeiros sinais de que a
advogada americana Jamie L. — que usa o pseudônimo M. E. Thomas —
poderia ter algum transtorno de personalidade.
"Na infância,
aos 8 ou 9 anos, estava assistindo televisão com meu pai quando vi uma
propaganda sobre uma campanha de arrecadação de fundos contra a fome na África.
As imagens mostravam uma criança muito magra. Na cena seguinte, uma
mosca pousava nos olhos dessa criança, que não esboçava nenhuma reação",
descreve ela.
"Eu comentei: 'Nossa, mas que criança burra… Ela não consegue nem afastar uma mosca dos próprios olhos?'"
O pai de Thomas, claro, estranhou a reação da filha e questionou se ela não tinha empatia.
"Eu
não sabia o que essa palavra significava. Ao entender o que era
empatia, percebi que talvez não tivesse mesmo esse sentimento", relata
ela.
Thomas compartilhou essa história durante uma roda de conversa promovida no dia 12 de agosto pela Psycopathy Is ("Psicopatia É", em tradução livre), uma associação criada por pesquisadores nos Estados Unidos para fomentar estudos sobre esse transtorno psiquiátrico.
O
grupo — o primeiro e único no mundo focado neste tema — também oferece
suporte a famílias com casos de psicopatia e realiza campanhas de
conscientização sobre o transtorno.
Dias
depois da palestra, Thomas aceitou o convite para conversar com a BBC
News Brasil, onde compartilhou alguns outros episódios que vivenciou nas
últimas décadas e sua trajetória antes e depois do diagnóstico.
Antes de entrar nos detalhes da entrevista, vale fazer uma breve explicação técnica.
Atualmente,
os manuais de psiquiatria não usam mais os termos sociopatia ou
psicopatia — algo que gera muita controvérsia e intermináveis debates
entre especialistas da área.
Essas
duas condições, psicopatia e sociopatia, estão de alguma maneira
englobadas no chamado "transtorno de personalidade antissocial" — embora
existam testes que avaliem especificamente traços de psicopatia.
A
Associação Americana de Psiquiatria classifica a condição como "uma das
doenças mentais mais incompreendidas, com pouco diagnóstico e
tratamento".
Como
é possível notar em vários trechos da entrevista, Thomas mesmo utiliza
todos os termos — sociopatia, psicopatia e transtorno de personalidade
antissocial — para descrever sua condição.
Ela começa contando sobre um episódio que viveu na transição entre a infância e a adolescência.
"Quando
tinha uns 12 anos, o pai de uma amiga veio falar comigo. Ele me disse
que a filha dele me adorava e prezava pela nossa amizade, mas gostaria
que eu parasse de bater nela", relata Thomas.
"Eu fiquei muito surpresa, porque nunca havia percebido que fazia aquilo."
A advogada também lembra de alguns episódios da infância e da adolescência em que ela invadiu a casa de pessoas próximas.
"A
ideia era apenas fazer uma brincadeira, como mudar algumas coisas de
lugar para deixar os moradores confusos. Eu acreditava que isso seria
engraçado, mas hoje percebo que se tratava de uma enorme invasão de
privacidade."
Nos
tempos de escola, Thomas também passou por episódios de agitação — como
quando arremessava livros ou dicionários em colegas durante uma aula
particularmente tediosa.
"Também brincávamos de um futebol americano sem nenhuma regra. Eu pegava alguns colegas e dava socos e mais socos neles."
Ainda
na adolescência, Thomas diz ter feito apostas com uma amiga para ver
quem conseguiria beijar um garoto que ambas gostavam. O problema é que
ela já sabia de antemão que o menino estava afim dela.
"Eu
não levei em consideração os sentimentos da minha amiga, fui apenas
oportunista. Na hora, só pensava nos vinte dólares que iria ganhar",
diz.
"Por
outro lado, sempre fui muito bem nas aulas e tirava boas notas. Então
os professores não sabiam muito bem como lidar comigo."
Thomas entende que sempre sentiu uma certa "insensibilidade, uma falta de consciência sobre o que acontecia" ao seu redor.
No entanto, isso não era algo que chamava sua atenção durante a infância e a adolescência.
"Eu não me considerava diferente dos demais. Talvez suspeitasse que apenas fosse mais esperta", afirma.
"Além disso, minha família é numerosa, somos mórmons e todos temos aptidões musicais. Então, de certa maneira, já éramos uma família um tanto esquisita", observa ela.
Será que você é sociopata?
Thomas
confessa que sempre notou uma "dificuldade em ser colocada em
determinadas situações", quando precisava fazer uma espécie de atuação
para mascarar aquilo que realmente sentia.
"Também sempre foi muito difícil me engajar em qualquer coisa, a menos que aquilo me trouxesse um benefício direto."
Uma das atividades que se encaixou nesse requisito da recompensa foi a faculdade de Direito, onde Thomas formou-se advogada.
Foi nos tempos de universidade que ela ouviu a primeira sugestão de que poderia sofrer com algum transtorno de personalidade.
No segundo ano de curso, em meados de 2004, ela fez um estágio num órgão governamental e dividiu o escritório com outra mulher.
"Não
havia muito o que fazer, então conversávamos bastante. E comecei a
notar que essa colega tinha várias vulnerabilidades, que eu poderia usar
para manipulá-la", lembra.
"Ela falava abertamente comigo e contou que foi abandonada pelos pais e adotada por outra família, era homossexual e ao mesmo tempo super religiosa."
Com
o passar do tempo, Thomas ficou muito interessada pela colega — e ela
própria começou a se abrir mais e a contar detalhes pessoais.
"Senti
que essa colega de estágio não representava qualquer tipo de ameaça
para mim. Ela era praticamente um passarinho ferido", compara.
"Hoje, sei que na verdade ela não era assim, e essa avaliação vinha de meu preconceito psicopata", pondera a advogada.
Depois
de algumas semanas de bate-papo, essa colega de trabalho fez uma
pergunta decisiva para a vida de Thomas: "Ela me disse: 'Você já
considerou a possibilidade de ser uma sociopata?'"
A palavra não despertou nenhuma emoção específica na estudante de Direito.
"Como sou mórmon, não havia visto nenhum dos filmes mais famosos e violentos que abordam esses transtornos, como Psicopata Americano", relata ela.
Entre
os sinais listados pelo especialista, estão charme, senso grandioso de
autoestima, necessidade de estímulos constantes, propensão ao tédio,
mentiras frequentes, facilidade de manipular os demais, falta de
remorso, ausência de empatia, impulsividade...
"Cheguei à conclusão que essas características me descreviam muito bem", conta Thomas.
"Mas
à época não dei muito valor a isso. Achei que essas informações eram
apenas uma curiosidade qualquer, como descobrir que você tem algum grau
de parentesco com uma antiga rainha da França", brinca ela.
Ao
redor de 2008, já formada e com a experiência de trabalhar num
escritório de advocacia prestigiado, Thomas começou a ver que sua vida
colapsava.
"A empresa passou a insinuar que não havia futuro para mim ali. Uma amiga muito próxima descobriu que o pai estava com câncer e eu decidi que precisava me afastar, porque ela estava com muitas demandas emocionais."
"Também enfrentei uma série de problemas em relacionamentos amorosos e com a minha família."
Nessa
época, Thomas notou que a vida dela era marcada por ciclos de cerca de
três anos. Depois desse tempo, tudo o que ela construía — em termos de
relacionamentos pessoais, amorosos e profissionais — virava ruína.
"Era como se eu apertasse um botão 'dane-se' e não conseguisse mais cumprir um papel", raciocina ela.
"Eu
não me sentia bem com isso, mas sempre chegava nesse ponto de não
gostar mais do trabalho, de cansar de fingir que era uma boa amiga... Eu
precisava parar tudo, porque não me sentia mais interessada, como se
aquelas coisas não valessem mais a pena."
Nesses
momentos de baixa, Thomas se sentia desgastada por precisar manter uma
certa "máscara de normalidade" diante dos outros, quando sentia
justamente o contrário.
"Foi aí que pensei: será que isso acontece comigo porque sou sociopata?"
Entre o blog e o livro, um diagnóstico
Nesse mar de incertezas, Thomas decidiu resgatar um hábito da infância e da adolescência: escrever em um diário.
Só que dessa vez, ela resolveu fazer isso no mundo digital. Para isso, criou o blog Sociopath World ("Mundo Sociopata", em tradução livre).
"Como
usava pseudônimo e nunca me identifiquei, muita gente sempre achou que
eu fosse um homem. Ninguém pensava que uma mulher estava por trás do
blog", observa.
Após
compartilhar textos na internet por cerca de um ano e meio, a advogada
recebeu uma mensagem de uma agente literária, que a convidou para
escrever um livro sobre o tema.
A ideia foi materializada em 2013, com a publicação de Confessions of a Sociopath: A Life Spent Hiding in Plain Sight ("Confissões de uma sociopata: Uma vida escondida à vista de todos", em tradução livre).
No
entanto, antes de iniciar esse projeto, Thomas sentiu a necessidade de
confirmar que de fato era acometida por um transtorno — até então, ela
tinha fortes suspeitas, mas nunca havia passado pela avaliação de um
profissional de saúde.
"Nesse
momento, em meados de 2010, já havia me recuperado e trabalhava como
professora de Direito. Se há algo bom de ser psicopata, é essa
capacidade de voltar ao auge rapidamente."
Um
psicólogo pediu que ela fizesse uma série de testes cognitivos. Após a
consulta, a conclusão estava clara: Thomas tinha mesmo um transtorno de
personalidade.
Ela avalia que receber o diagnóstico "oficial" não representou nenhum significado especial na vida dela.
"Sabe
quando você já suspeita de algo? Para mim, o diagnóstico foi parecido
ao caso das mulheres que de certa maneira sentem que estão grávidas e só fazem um teste para confirmar aquilo que já tinham conhecimento", compara ela.
"Mas,
por outro lado, eu até tinha esperanças de que poderia ser
diagnosticada com qualquer outra doença, porque assim as coisas seriam
muito mais fáceis para mim."
"Se os profissionais de saúde tivessem detectado um câncer no meu cérebro, por exemplo, seria responsabilidade deles cortar o tumor dali."
"Agora,
o transtorno de personalidade é um trabalho com o qual eu mesma
precisarei lidar pelo resto da minha vida", complementa ela.
No entanto, mesmo com o diagnóstico em mãos, Thomas não iniciou o tratamento logo de cara.
"Aqui
nos Estados Unidos, os seguros de saúde só aceitam pagar por terapias
que são consideradas efetivas pelas associações da área. E,
estranhamente, não existem tratamentos que se encaixam nesse critério
para o transtorno de personalidade antissocial."
"Muitos especialistas também não se sentem à vontade para lidar com pacientes que tenham sociopatia ou psicopatia", acrescenta.
Preços de assumir abertamente a psicopatia
Após o lançamento do livro em 2013, Thomas participou de algumas entrevistas na televisão — e algumas pessoas a reconheceram.
"Um
dos alunos do curso de Direito escreveu à administração da faculdade
para dizer que se sentia ameaçado pelo fato de ter uma professora
sociopata", diz.
"A equipe de segurança da universidade me mandou um e-mail para informar que eu não poderia mais ir ao campus."
"Eu
respondi que aquilo era um ato grosseiro de discriminação e que me
solidarizava com o fato de o aluno se sentir ameaçado, mas nunca fiz
nada diretamente contra ele", afirma.
"Além
disso, eu não tinha, e não tenho, nenhum histórico criminal ou de
violência depois de adulta. Achei absurdo alguém manifestar um incômodo
pela minha simples existência."
Segundo
Thomas, a direção dobrou a aposta. "Eles me informaram que, além de ser
demitida e banida, eu estava proibida de transitar num raio de um
quilômetro do campus ou de qualquer pessoa relacionada com a faculdade."
"Sofri muito preconceito e ninguém parecia ligar", lamenta ela.
"As
pessoas me trataram muito mal e desenvolvi uma espécie de transtorno
pós-traumático. Durante a noite, eu acordava de súbito, com crises de ansiedade", conta.
Nessa mesma época, um irmão da advogada que sempre teve problemas de saúde mental começou a fazer sessões com um psicoterapeuta.
"Ele
fez o tratamento por cerca de dez meses e parecia uma outra pessoa. Ele
tinha uma série de problemas e rapidamente se tornou um adulto
funcional e competente."
A advogada resolveu seguir o exemplo do familiar e começou a fazer sessões com o mesmo terapeuta.
"Por
questões relacionadas ao plano de saúde, ele definiu logo de cara que
iria tratar o meu transtorno de personalidade, mas não chegou a
especificar o tipo."
Uma das primeiras metas traçadas nas consultas foi lidar com o "vício" em manipular as pessoas.
"Eu não sabia como manter um relacionamento com alguém sem fazer isso", admite Thomas.
"O
terapeuta me chamava a atenção para determinadas situações e me sugeria
maneiras de fazer pequenos ajustes na forma como interagia com os
outros", detalha ela.
A advogada admite que passou a sentir-se bem melhor conforme o tratamento evoluiu.
"Não
foram apenas os relacionamentos que melhoraram, mas a minha própria
experiência neles evoluiu. Esse contato com os outros se tornou mais
relevante, mais real, e comecei a me importar mais com as pessoas", diz
ela.
"Antes,
eu via as interações sociais como algo semelhante a ir para academia.
Era algo que eu precisava fazer, mas não necessariamente gostava. Hoje
em dia, os relacionamentos são super recompensadores para mim."
Em
2017, Thomas iniciou um novo projeto: conhecer e conversar com outros
indivíduos com suspeita ou diagnóstico de transtorno de personalidade
antissocial.
"A
primeira pessoa que visitei foi na Tasmânia, na Austrália. A mais
recente foi em Amsterdã, na Holanda, em abril deste ano", informa ela.
Segundo a advogada, geralmente esses contatos têm dois propósitos principais.
"Primeiro,
há um grupo de pessoas que suspeitam ter sociopatia ou psicopatia. Elas
me descobrem pelo blog ou pelo livro e se identificam com o que conto."
"A
segunda categoria engloba os indivíduos que precisam de ajuda. Eles
estão num período de dificuldade e não sabem o que fazer para mudar."
Futuro sem estigmas e preconceitos
Apesar
de entender a importância de falar abertamente sobre a psicopatia e o
transtorno de personalidade antissocial, Thomas se ressente do
preconceito que precisa enfrentar.
"Muitas pessoas me tratam mal em nome de uma pretensa intenção de se proteger de mim", destaca ela.
Talvez o estigma mais forte seja aquele que relaciona psicopatia com violência e atos criminosos.
A associação Psycopathy Is admite que "a psicopatia aumenta o risco de comportamentos agressivos e antissociais".
"No entanto, muitas pessoas com psicopatia não são violentas. E muitas pessoas que são violentas não são psicopatas."
"Cada
indivíduo com psicopatia possui diferentes atributos e desafios — e a
forma como crianças ou adultos com psicopatia se saem na escola, no
trabalho ou em ambientes sociais varia bastante", pontua a entidade.
Para
Thomas, que segue trabalhando com advocacia, esses estigmas
relacionados à psicopatia vêm em parte da própria ciência, "por meio de
pesquisas que fazem extrapolações e estão longe de representar a
diversidade de pacientes com o transtorno".
"Existem
muitos fatores que podem causar a violência, e a psicopatia é apenas
uma delas. O mesmo vale para outros transtornos", defende a advogada.
Mas ela suspeita que muitos preconceitos e temores relacionados à psicopatia têm uma origem ainda mais profunda.
"De
onde vem essa estranha necessidade das pessoas se preocuparem com a
forma como os outros manifestam seus sentimentos?", questiona ela.
A
advogada cita o exemplo hipotético de um funeral. Geralmente, é
esperado que todos demonstrem tristeza, chorem ou ao menos se compadeçam
dos familiares e amigos que estão num momento de sofrimento.
No
entanto, pessoas com transtorno de personalidade antissocial podem não
ter esses sentimentos num momento desses — e muitas vezes precisam
fingir e atuar para não serem julgados e criticados.
"Me
parece que a sociedade está sempre policiando os sentimentos — e todos
aqueles que possuem um universo emotivo diferente, que experimentam a
empatia de formas diversas, são discriminados."
Thomas cita o movimento de humanização do autismo: até pouco tempo atrás, indivíduos com esse transtorno eram excluídos e não existiam estruturas para acolhê-los na sociedade.
Felizmente,
esse cenário está mudando — nos últimos anos, campanhas de
conscientização e políticas públicas criaram espaços adaptados, para que
pessoas com autismo fossem incluídas e pudessem participar de diversas
atividades.
"Espero
que isso seja ampliado para públicos com outras condições além do
autismo. Como psicopata, quero que a sociedade entenda e acolha o meu
transtorno", diz ela.
"Sonho
com um futuro em que a psicopatia não seja apenas acolhida, mas que
pessoas com diferentes diagnósticos psiquiátricos possam expressar suas
reações emocionais sem serem julgadas."
Thomas pondera que "psicopatas que cometeram crimes precisam ser punidos por suas ações".
"Se eles fizeram algo errado, devem ir à prisão como qualquer um", reforça ela.
"Mas
não me parece correto que pessoas com o transtorno que nunca se
envolveram em qualquer problema legal sejam constantemente julgadas,
perseguidas e obrigadas a mascarar seus sentimentos."
"Isso
requer muita energia nossa. Seria muito melhor para os psicopatas e
para a própria sociedade se pudéssemos ser nós mesmos."
"Se
não tivéssemos que usar tanta força de vontade para mascarar quem
somos, talvez sobrasse mais energia para fazer coisas boas pela
sociedade, como nutrir relacionamentos ou propor soluções", defende.
Questionada
se há uma única coisa que o público em geral poderia aprender sobre a
psicopatia, Thomas responde que é preciso acabar com generalizações que
transformam todo um grupo em algo negativo.
"Certamente
existem muitas coisas consideradas ruins entre psicopatas. Mas talvez a
primeira delas seja o fato de sermos diferentes", conclui ela.
Cientistas da Universidade de Stanford classificaram a depressão em seis novos tipos em estudo publicado na revista científica Nature Medicine
na última segunda-feira (17) — o trabalho envolveu o imageamento de
centenas de pacientes e tecnologias de aprendizado de máquina para
detectar padrões de atividade cerebral.
No tratamento atual da condição, estima-se que 30% dos pacientes tenham o que se chama “depressão resistente ao tratamento”,
ou seja, quando terapias e medicamentos geralmente usados pela medicina
não produzem melhora. Isso, em geral, deriva da dificuldade de
descobrir qual antidepressivo funciona melhor individualmente: a prescrição costuma ser feita por tentativa e erro.
Buscando melhorar a situação, os pesquisadores estudaram 801 pacientes diagnosticados com depressão ou
ansiedade com ressonância magnética, tanto em repouso quanto durante
atividades desenhadas para o teste de funções emocionais e cognitivas.
Um tratamento para cada depressão
Com as imagens cerebrais em mãos, os cientistas usaram análise de cluster, um método de agrupamento que usa aprendizado de máquina, para juntar cérebros “semelhantes”, identificando seis padrões de atividade cerebral
diferentes. A partir disso, 250 voluntários diferentes foram
selecionados para receber um dos três antidepressivos mais comuns usados
em tratamentos médicos.
No cérebro com o padrão de maior
hiperatividade nas regiões cognitivas, o medicamento mais efetivo foi a
venlafaxina. Já nos cérebros onde o padrão em repouso gera mais
atividade associada à depressão e resolução de problemas, a psicoterapia cognitivo-comportamental foi mais eficiente.
Em
um terceiro tipo, onde houve menor atividade em repouso na parte do
cérebro responsável pela atenção, a psicoterapia teve a menor
performance na redução da depressão em comparação aos outros padrões
cerebrais.
A diferença entre
cada tipo influencia tanto na eficiência dos diferentes tratamentos
quanto nos sintomas dos pacientes. Em quem a região cognitiva do cérebro
é mais hiperativa, há maior dificuldade de sentir prazer e em
desempenhar tarefas relacionadas a funções executivas, por exemplo — nos
mais receptivos à psicoterapia, as funções executivas também ficam
prejudicadas, mas as tarefas cognitivas, não.
Os cientistas esperam que, com o estudo, seja possível testar mais tratamentos contra a depressão e
de maneira mais eficiente, verificando o que funciona melhor para cada
um dos seis tipos e incluindo medicamentos ainda não usados contra o
transtorno.
As mudanças no raciocínio e na memória à medida que envelhecemos
podem ocorrer por várias razões. E nem sempre são motivo de
preocupação. Mas quando começam a interferir na vida cotidiana, podem
indicar os primeiros sinais de demência.
Outro termo que pode surgir quando falamos de demência é doença de Alzheimer, ou simplesmente Alzheimer.Mas, afinal, qual é a diferença?
O que é demência?
Demência
é um termo genérico usado para descrever uma série de síndromes que
resultam em alterações na memória, raciocínio e/ou comportamento devido à
degeneração do cérebro.
Para
atender os critérios de demência, estas alterações devem ser
suficientemente pronunciadas a ponto de interferir nas atividades
habituais e estar presentes em pelo menos dois aspectos diferentes do
raciocínio ou da memória.
Pouca gente sabe que a demência também pode afetar crianças.
Isto se deve a danos cerebrais progressivos associados a mais de 100
doenças genéticas raras. E pode resultar em mudanças cognitivas
semelhantes às que vemos em adultos.
E o que é Alzheimer?
Alzheimer é o tipo mais comum de demência, representando cerca de 60% a 80% dos casos.
Por isso, não surpreende que muitas pessoas utilizem os termos demência e Alzheimer de forma intercambiável.
As
alterações na memória são o sinal mais comum de Alzheimer — e é o
sintoma que a população mais costuma associar à doença. Por exemplo, uma
pessoa com Alzheimer pode ter dificuldade de se lembrar de eventos
recentes ou de saber em que dia ou mês estamos.
Ainda
não sabemos exatamente o que causa o Alzheimer. No entanto, sabemos que
a doença que está associada ao acúmulo no cérebro de dois tipos de
proteínas chamadas beta-amiloide e tau.
Embora
todos nós tenhamos alguma beta-amiloide, quando ela se acumula em
excesso no cérebro, se aglomera, formando placas nos espaços entre as
células.
Estas
placas causam danos (inflamação) às células cerebrais ao redor e levam à
desregulação da tau. A tau faz parte da estrutura das células
cerebrais, mas no Alzheimer estas proteínas ficam "emaranhadas". Isto é
tóxico para as células, fazendo com que morram.
Acredita-se
que aconteça então um ciclo de retroalimentação, desencadeando a
produção de mais beta-amiloide e mais tau anormal, perpetuando os danos
às células cerebrais.
O Alzheimer também pode ocorrer com outras formas de demência, como a demência vascular. Esta combinação é o exemplo mais comum de demência mista.
Demência vascular
O segundo tipo mais comum de demência é a demência vascular. Ela resulta da interrupção do fluxo sanguíneo para o cérebro.
Como
as alterações no fluxo sanguíneo podem ocorrer em todo o cérebro, os
sinais de demência vascular podem ser mais variados do que as alterações
de memória normalmente observadas no Alzheimer.
Por
exemplo, a demência vascular pode se apresentar como uma confusão
geral, raciocínio lento ou dificuldade em organizar pensamentos e ações.
Algumas
pessoas podem não saber que a demência também pode afetar o
comportamento e/ou a linguagem. Vemos isso em diferentes formas de demência frontotemporal.
A
variante comportamental da demência frontotemporal é a segunda forma
mais comum (depois do Alzheimer) de demência precoce (em pessoas com
menos de 65 anos).
As
pessoas com este tipo de demência podem ter dificuldade de interpretar e
responder adequadamente a situações sociais. Por exemplo, elas podem
fazer comentários estranhamente rudes ou ofensivos ou invadir o espaço
pessoal dos outros.
A
demência semântica também é um tipo de demência frontotemporal — ela
resulta na dificuldade de compreender o significado das palavras e
denominar objetos do cotidiano.
Demência por corpos de Lewy
A
demência por corpos de Lewy é resultado da desregulação de um tipo
diferente de proteína conhecida como alfa-sinucleína. Muitas vezes
observamos isso em pacientes com Parkinson.
Portanto,
pessoas com este tipo de demência podem ter movimentos alterados, como
postura curvada, andar arrastado e alterações na caligrafia. Outros
sintomas incluem mudanças no estado de alerta, alucinações visuais e
perturbações significativas do sono.
Como saber se você ou alguém tem demência
Se
você ou alguém próximo estiver preocupado, a primeira coisa a fazer é
conversar com um médico. Ele provavelmente vai fazer algumas perguntas
sobre seu histórico de saúde e querer saber que mudanças você notou.
Às
vezes, pode não ficar claro se você tem demência logo na primeira
consulta. O médico pode sugerir que você observe as mudanças ou pode
encaminhar você para um especialista para exames adicionais.
Não
existe um exame único que mostre claramente se você tem demência ou o
tipo de demência. O diagnóstico é feito após vários exames, incluindo
tomografias ou ressonâncias, testes de memória e raciocínio, e uma
avaliação de como essas mudanças afetam sua vida diária.
Não
saber o que está acontecendo pode ser um momento desafiador, por isso é
importante conversar com alguém sobre como você está se sentindo ou
entrar em contato com serviços de apoio.
*
Nikki-Anne Wilson é pesquisadora de pós-doutorado do Neuroscience
Research Australia (NeuRA), na Universidade de Nova Gales do Sul em
Sydney.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).
Ao todo, 5,3% dos americanos com mais de 12 anos têm Transtorno por
Uso de Álcool (AUD), de acordo com a edição de 2019 da National Survey
of Drug Use and Health (Pesquisa Nacional de Uso de Drogas, em
português), promovida pelo governo dos Estados Unidos. O Brasil, por sua
vez, está se aproximando deste índice: uma publicação de agosto da
Sociedade Brasileira de Neurologia (SBN) mostrou que quase 3% da
população acima de 15 anos já pode ser considerada alcoólatra.
“Pesquisas indicam que o uso de álcool durante a adolescência pode
interferir no desenvolvimento normal do cérebro adolescente e aumentar o
risco de desenvolver AUD”, alerta Sandro Blasi Espósito, doutor em
Neurologia e professor da Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde
(FCMS) da PUC-SP.
“Além disso, o consumo de álcool por menores contribui para uma série
de consequências agudas, incluindo lesões, agressões sexuais, overdose
por bebida e mortes – incluindo aquelas decorrentes de acidentes com
veículos motorizados”, completa.
Nessa mesma linha, a neurocirurgiã Vanessa Milanese, diretora de
comunicação da SBN, comenta: "Estes números podem representar uma
pequena fração da sociedade; porém, quando somados, correspondem a mais
de quatro milhões de brasileiros”. Ela prossegue: “O declínio cognitivo
causado pelo álcool provoca a alteração de funções cerebrais
hipocampais. Ou seja: são milhares de pessoas que, futuramente, poderão
ter problemas cognitivos, graves ou não, o que pode desencadear um
grande impacto no atendimento de geriatras, neurologistas e
neurocirurgiões em todo o Brasil”.
Bebida alcoólica em moderação também é prejudicial
Recentemente, estudo produzido pela Universidade de Oxford (Reino
Unido) apontou que o uso de álcool por pessoas de qualquer idade pode
causar declínio de funções cerebrais – ou seja, problemas relacionados à
cognição. Isso ocorre mesmo se as bebidas forem consumidas de forma
moderada, uma vez que o acúmulo de ferro no cérebro tem sido associado a
diferentes condições neurodegenerativas.
Pense/IBGE também registrou o alcoolismo entre jovens
Em agosto, a Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (Pense), divulgada
pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), apurou que o
consumo de álcool entre jovens com idades entre 13 e 17 anos, do 9º ano
do Ensino Fundamental, nas redes públicas e privadas de todas as
capitais do Brasil, aumentou de 52,9% em 2012 para 63,2% em 2019.
O aumento foi maior entre as meninas (de 55% para 67,4%, no mesmo período) do que entre os meninos (de 50,4% para 58,8%).
Você sabia que o suicídio é a terceira causa de morte entre jovens
brasileiros entre 15 e 29 anos? O dado da Organização Mundial da Saúde
(OMS) é alarmante e remete a um problema de saúde pública no Brasil. A
taxa de suicídios no país afeta cerca de 12 mil vidas por ano,
representando quase 6% para cada para cada 100.000 habitantes o que
coloca o Brasil logo atrás dos Estados Unidos nesse ranking.
Não
é por acaso que, desde 2003, o dia 10 de setembro é celebrado como o
Dia Mundial de Prevenção do Suicídio, com o Brasil aderindo à campanha
Setembro Amarelo há cinco anos.
Perfil das vítimas
Os
números revelam uma realidade preocupante quando se analisa o perfil
das vítimas brasileiras. A maioria é composta por homens negros, com
idades entre 10 e 29 anos, de acordo com dados do Ministério da Saúde.
Cerca de 96,8% dos casos de suicídio entre jovens estão relacionados a
transtornos mentais, com a depressão liderando a lista, seguida pelo
transtorno bipolar e abuso de drogas.
Além disso, fatores como
desemprego, sentimentos de vergonha, desonra, desilusões amorosas e
antecedentes de doenças mentais também são identificados como riscos
para o suicídio.
"Setembro amarelo não é só uma cor ou uma
data, é uma campanha de conscientização, de esclarecimento, e
desmistificação sobre o que é o suicídio, e do porquê devemos estar
atentos aos sinais de depressão entre os jovens. Falar sobre saúde
mental no mundo pós-pandemia é urgente, no mundo virtual, mais ainda",
reforçou a psicóloga da Unigranrio, Leila Navarro.
Fatores de risco na adolescência
A
adolescência é um período crucial de desenvolvimento e, como todas as
fases do desenvolvimento humano, apresenta desafios únicos. Ainda que o
adolescente possa ter uma boa saúde mental, mudanças físicas, emocionais
e sociais, bem como a exposição a fatores como a pobreza, abuso ou
violência, pode torná-lo mais vulnerável a problemas de saúde mental. A
depressão é uma das principais causas de doença e incapacidade entre
adolescentes globalmente, e as consequências de não abordar essas
condições afetam a idade adulta, prejudicando a saúde física e mental e
limitando oportunidades futuras.
Dentro do espaço escolar,
por exemplo, é possível identificar quando um estudante apresenta sinais
silenciosos, que podem estar atrelados aos sintomas de doenças como
ansiedade e depressão. Os educadores são capazes de observar indicadores
como isolamento, desinteresse e agressividade, o que pode se agravar
caso não haja um olhar especializado para isso.
Saúde mental x internet
O
uso extensivo de redes sociais e a internet pelos jovens têm potencial
impacto na saúde mental. No Brasil, 66% da população, ou 140 milhões de
pessoas, são usuários ativos em redes sociais, com a maioria acessando
via dispositivos móveis. O tempo médio gasto nas redes sociais é de 3
horas e 34 minutos por dia. Esse novo perfil de internauta é jovem e
passa a maior parte do tempo em um mundo virtual, o que pode prejudicar a
habilidade de interação pessoal.
Além disso, o uso
excessivo da internet e das redes sociais por jovens e adolescentes traz
riscos potenciais, incluindo o compartilhamento de conteúdos
inadequados, como pornografia, discriminação e ódio, bem como
aliciamento moral e sexual, assédio, invasão de privacidade e
cyberbullying. "A tecnologia e a utilização da internet é um caminho sem
volta no mundo moderno, todavia, para os especialistas, é importante
que se ofereçam ferramentas de autoconhecimento para que crianças e
jovens estejam preparados para aproveitar a parte boa da revolução
tecnológica", completou Gabas.
Para combater essa crescente
crise, a OMS insta todos os países, incluindo o Brasil, a acelerarem a
implementação do Plano de Ação Integral de Saúde Mental 20132030, que
prevê medidas para a reorganização dos ambientes que influenciam a saúde
mental e o fortalecimento dos sistemas de atenção, abrangendo lares,
comunidades, escolas, locais de trabalho e serviços de saúde. Sugere
ainda medidas como preparar pais, familiares e educadores para abordar o
tema da saúde mental como parte da saúde integral. O auxílio de
profissionais de saúde especializados é algo que pode fazer muita
diferença para quem está em situação de vulnerabilidade.
Um em cada quatro brasileiros (23,7%) com 60 anos ou mais consome álcool. Além disso, 6,7% (aproximadamente 2 milhões de idosos) relatam
consumir diversas doses de uma só vez, formando um padrão de consumo
abusivo e extremamente prejudicial conhecido como binge drinking. E 3,8%
(mais de 1 milhão) costumam beber, em uma semana típica, entre 7 a 14
doses por semana, quantidades que podem colocar em risco sua saúde.
As informações são de um estudo conduzido pela Universidade Federal
de São Paulo (Unifesp), publicado nas revistsa científicas Substance Use
& Misuse e BMJ Open. De acordo com a Sociedade Brasileira de
Geriatria e Gerontologia (SBGG), os números mostram que o consumo de
bebidas pelos idosos no Brasil pode ser considerado um problema de saúde
pública. E esse cenário não é exclusivo do Brasil.
Nos Estados Unidos, as autoridades de saúde pública também estão cada
vez mais alarmadas com o consumo de álcool dos idosos. O número anual
de mortes relacionadas com o álcool de 2020 a 2021 ultrapassou 178 mil,
de acordo com dados divulgados recentemente pelos Centros de Controle e
Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês). Isso representa mais
mortes do que todas as overdoses por drogas combinadas.
Uma análise do Instituto Nacional sobre Abuso de Álcool e Alcoolismo
mostra que as pessoas com mais de 65 anos representavam 38% desse total.
De 1999 a 2020, o aumento de 237% nas mortes relacionadas com o álcool
entre aqueles com mais de 55 anos foi superior ao de qualquer grupo
etário, exceto entre os de 25 a 34 anos. Em grande parte, os americanos não conseguem reconhecer os perigos do
álcool, afirma George Koob, diretor do instituto que conduziu o estudo.
— O álcool é um lubrificante social quando usado dentro das diretrizes,
mas não creio que eles percebam que à medida que a dose aumenta, ele se
torna uma toxina. E é ainda menos provável que a população mais velha
reconheça isso — o especialista argumenta.
A taxa de pessoas com
mais de 65 anos que declara ter consumido álcool no último ano (cerca de
56%) e no último mês (cerca de 43%) são mais baixas do que para todos
os outros grupos de adultos. No entanto, os consumidores mais velhos são
muito mais propensos a beber com frequência, 20 dias ou mais por mês,
do que os mais jovens.
Além disso, uma análise feita em 2018 concluiu que o consumo
excessivo de álcool (definido como quatro ou mais bebidas em uma única
ocasião para as mulheres, cinco ou mais para os homens) aumentou quase
40% entre os americanos mais velhos nos últimos 10 a 15 anos.
Por que esse aumento está acontecendo?
A pandemia claramente desempenhou um papel importante no aumento de
casos de consumo excessivo de álcool. Segundo estatísticas do CDC, houve
crescimento no número de mortes atribuídas diretamente ao consumo de
álcool, de atendimentos de emergência associados ao álcool e das vendas
de álcool per capita entre 2019 e 2020, à medida que a Covid-19 se
espalhava mundialmente e restrições eram estabelecidas.
— Muitos fatores de estresse nos impactaram bastante, principalmente o
isolamento e as preocupações de adoecer. A mudança nos dados indicam a
tendência das pessoas de beber mais para lidar com esse estresse — Koob
constata.
Os pesquisadores também citam um fenômeno chamado efeito de coorte,
isto é, variações nos resultados do estudo em grupos específicos. De
acordo com Keith Humphreys, psicólogo e pesquisador de dependência em
Stanford, os boomers (pessoas nascidas entre as décadas de 1940 e 1960)
são uma geração que "usa mais substâncias", em comparação com aqueles
que vieram antes e depois deles, e parecem não abandonar seu
comportamento juvenil.
De 1997 a 2014, o consumo de álcool aumentou em média 0,7% ao ano
entre os homens com mais de 60 anos, enquanto o consumo excessivo
permaneceu estável. Entre as mulheres mais velhas, o consumo de álcool
aumentou 1,6% anualmente, e o consumo excessivo aumentou 3,7%.
— Ao contrário dos estereótipos, as pessoas instruídas da classe
média alta têm taxas mais elevadas de consumo de álcool. Nas últimas
décadas, à medida que as mulheres foram ficando mais instruídas, elas
ingressaram em locais de trabalho onde beber era normativo, e elas
também tinham mais renda disponível. As mulheres que se aposentam agora
têm maior probabilidade de beber do que as suas mães e avós — o
psicólogo explica.
No entanto, o consumo de álcool representa um impacto ainda maior
para os idosos, especialmente para as mulheres, que ficam intoxicadas
mais rapidamente do que os homens porque são menores e têm menos enzimas
intestinais que metabolizam o álcool.
Os idosos podem argumentar que estão apenas bebendo como sempre
fizeram, mas as quantidades equivalentes de álcool têm consequências
muito mais desastrosas para os mais velhos, cujos corpos não conseguem
processá-lo tão rapidamente, alerta David Oslin, psiquiatra da
Universidade da Pensilvânia e do Centro Médico para Veteranos de Guerra,
na Filadélfia.
— O excesso causa redução do tempo de resposta do pensamento e da
capacidade cognitiva à medida que o paciente envelhece — esclarece.
Já muito associado a doenças hepáticas, o álcool também agrava
doenças cardiovasculares e renais, se você bebe há muitos anos, além de
causar um aumento na incidência de certos tipos de câncer, o psiquiatra
adverte. Segundo ele, beber contribui para quedas, uma das principais
causas de lesões à medida que as pessoas envelhecem, e perturba o sono.
Os idosos também tomam muitos medicamentos prescritos e o álcool
interage com muitos deles. Essas interações são comuns com analgésicos e
soníferos, como os benzodiazepínicos, às vezes causando sedação
excessiva. Em outros casos, o álcool pode reduzir a eficácia de um
medicamento.
Caminhos para a solução
Uma proposta para combater o uso indevido de álcool entre os idosos é
aumentar o imposto federal sobre o álcool, pela primeira vez em décadas.
— O consumo de álcool é sensível ao preço e é bastante barato neste momento em relação à renda — ressalta Humphreys.
Resistir ao lobby da indústria e encarecer o álcool, tal como
impostos mais elevados tornaram os cigarros mais caros, poderia reduzir o
consumo.
Os tratamentos para o uso excessivo de álcool, incluindo psicoterapia
e medicamentos, não são menos eficazes para pacientes mais velhos,
esclarece Oslin.
— Na verdade, a idade pode garantir uma resposta positiva. Além
disso, o tratamento não significa necessariamente que você tenha que se
abster. Trabalhamos com as pessoas para moderar o consumo de álcool —
argumenta.
Mas a lei federal de 2008, que exige que as seguradoras de saúde
proporcionem paridade – ou seja, a mesma cobertura médica é oferecida
para curar problemas físicos e tratar da saúde mental– não se aplica ao
Medicare, o plano de saúde oferecido pelo governo dos EUA a pacientes
com mais de 65 anos. Vários grupos políticos e de defesa dos direitos de
idosos estão trabalhando para eliminar tais disparidades.
Dean Nordman nunca procurou tratamento para o seu alcoolismo, mas
após a cirurgia de emergência, os seus filhos o transferiram para um lar
de idosos, onde os antidepressivos e a falta de acesso ao álcool
melhoraram o seu humor e a sua sociabilidade. Ele morreu no asilo, em
2017.
Doug Nordman, a quem seu pai apresentou a cerveja aos 13 anos, bebia
muito e chegava ao ponto do desmaio quando era estudante universitário.
Depois dessa fase, passou a beber socialmente.
Mas ao ver seu pai recusar ajuda, “percebi que isso era ridículo”,
ele relembra. O álcool poderia agravar a progressão do declínio
cognitivo e ele tinha histórico familiar. Ele continua sóbrio desde
aquele telefonema, há 13 anos.