A eletroconvulsoterapia
(ECT), também conhecida como eletrochoque, é o uso de um estímulo
elétrico para provocar uma crise epiléptica generalizada, no cérebro
(1).
Na prática, isto significa que o cérebro vai
apresentar uma atividade igual à observada naquelas crises epilépticas
em que a pessoa tem uma fase de rigidez, seguida de movimentos bruscos e
repetidos de braços e pernas. Entretanto, a crise ocorre apenas no
cérebro, já que o corpo se encontra sob o efeito de relaxantes
musculares.
Indicações da eletroconvulsoterpia
Este tipo de tratamento é usado principalmente em
casos de depressão ou transtorno bipolar graves, após tentativas
malsucedidas com medicações. Há estudos também no tratamento da
esquizofrenia, porém eles são menos conclusivos.
Os principais motivos pelos quais este tratamento é
usado apenas como uma das últimas opções são o custo (mais elevado, em
curto prazo, que o do tratamento com antidepressivos) e o preconceito
que ainda há contra ele. Do ponto de vista médico, há sugestões para que
se use a ECT como uma opção mais precoce, na abordagem dos transtornos.
(2)
Como funciona a eletroconvulsoterpia
Como no caso dos tratamentos psiquiátricos
medicamentosos, não se conhecem os mecanismos exatos através dos quais a
estimulação elétrica produz resultados, mas se acredita que eles sejam
devidos aos efeitos sobre a comunicação entre as células nervosas
cerebrais, por alterações na quantidade de neurotransmissores, das
moléculas às quais eles se ligam, nas membranas das células, assim como
na síntese de proteínas e neurotransmissores dentro delas.
Contraindicações da eletroconvulsoterapia
A ECT é um tratamento muito seguro e talvez a única
situação na qual ela seja proibida é quando a pessoa possui um implante
coclear (um dispositivo inserido no crânio de pessoas com surdez
grave).(1)
Porém, costuma ser evitada em:
- casos de infarto recente no coração
- acidente vascular cerebral (AVC) recente com sintomas residuais
- instabilidade do funcionamento cardíaco
- doença pulmonar grave
- aneurisma cerebral instável (vaso cerebral dilatado, com possibilidades de sangramento)
- aumento da pressão no líquido (líquor) que banha o cérebro
- se estiver associado a alterações no volume do cérebro como, por exemplo, no caso de alguns tumores)
- em casos nos quais os riscos da anestesia sejam muito grandes.
Mesmo nestes casos, a ECT pode ser administrada, se houver um controle cuidadoso das condições da aplicação. (1)
Preparação da eletroconvulsoterapia
Em função das contraindicações acima, a ECT costuma
ser precedida de uma série de exames de sangue, tomografia cerebral e
eletrocardiograma.
Antes de se aplicar o estímulo elétrico, para que
não haja contrações musculares fortes que possam causar quaisquer lesões
ou dores, aplica-se um relaxante muscular e, para que os procedimentos
sejam facilitados, a pessoa é submetida a uma anestesia geral leve, de
modo que minutos após o procedimento ela desperte.
Um aspecto interessante é que a anestesia não é
aplicada para que a pessoa não sinta dor, pois a própria passagem do
estímulo elétrico deixa a pessoa inconsciente e, portanto, sem sensações
dolorosas. Os principais motivos da anestesia são justamente
possibilitar esta respiração induzida e evitar o desconforto do
relaxante muscular, que deixa a pessoa paralisada.
No dia da aplicação, a pessoa deve estar em jejum, como em todos os procedimentos em que se usa anestesia geral.
Estas ações não devem assustar ninguém, pois são
usadas em qualquer procedimento que necessite de anestesia geral, à qual
as pessoas frequentemente se submetem em cirurgias.
O procedimento
Em seguida a este processo, executado por um médico
especialista em anestesias, aplica-se um breve estímulo elétrico na
cabeça da pessoa. A duração do estímulo elétrico é variável e decidida
pelo psiquiatra, durando no máximo poucos segundos e, em anos mais
recentes, há cada vez mais estudos sobre estímulos "ultracurtos", com
duração inferior a meio segundo. (1)
Há variações de opinião quanto ao local em que deve
ser aplicada a corrente elétrica como, por exemplo, se o estímulo deve
ser dado de ambos os lados da cabeça ou num único lado. Há indícios de
que a aplicação dos dois lados seja mais eficaz, porém a aplicação de
apenas um lado tenha menos efeitos colaterais, que ocorrem basicamente
sobre a memória (1).
As aplicações são feitas de duas a três vezes por
semana, a intervalos regulares. Em pessoas mais idosas ou quando houver
um déficit de memória mais prolongado, prefere-se a primeira opção. A
melhora costuma ocorrer num prazo médio de duas a três semanas (como no
caso dos antidepressivos) apesar de que, em alguns casos, há uma melhora
inicial já nas primeiras (ou mesmo na primeira) aplicações. Por este
motivo, a ECT é uma opção muitas vezes preferencial, em casos mais
graves, nos quais se quer tentar um efeito mais rápido.
Apesar de não existir um número máximo de vezes que
a pessoa pode passar pelo procedimento, muitas vezes ele é interrompido
se após seis aplicações não houver indícios de melhora.
Se houver melhora, de modo geral, faz-se um total
de oito a doze aplicações, a critério do psiquiatra. Um aspecto
interessante é que, frequentemente, após uma série de ECT, as pessoas
ficam mais sensíveis à ação antidepressiva dos remédios. Isto
possibilita que medicações anteriormente usadas e que não foram eficazes
possam ser novamente tentadas, com resultados positivos. Isto pode
ocorrer mesmo quando a ECT não leva a uma melhora completa (e até quando
não há nenhuma melhora).
Habitualmente, após uma série de ECT, a pessoa é
tratada com medicações antidepressivas, apesar de que, em casos nos
quais a eficácia destas continuar insuficiente, as sessões podem ser
repetidas como tratamento de manutenção.
Esta manutenção não tem parâmetros tão bem
estabelecidos em relação à frequência com que devem ser feitas as
aplicações. Finalmente, se houve uma boa melhora numa série inicial de
sessões de ECT, este tratamento pode ser repetido se houver recidiva do
problema.
Efeitos colaterais da eletroconvulsoterapia
Estes efeitos sobre a memória costumam ser
perceptíveis apenas por algumas horas (em pessoas idosas podem durar
mais) e consistem de uma dificuldade de gravar e rememorar fatos
recentes, de modo que é possível ver a pessoa repetindo várias vezes a
mesma pergunta ou fazendo várias vezes as mesmas observações.
Há dúvidas, ainda, sobre a possibilidade de a ECT
causar deficiências em longo prazo, o que ocorreria basicamente sobre a
memória autobiográfica, a capacidade de a pessoa recordar fatos de sua
vida.(3)
Um efeito colateral relativamente frequente, também, é uma dor de cabeça
logo após a pessoa despertar da anestesia. Este tipo de complicação
costuma ser prevenida através da aplicação endovenosa de um
anti-inflamatório pelo anestesista.
Outros tratamentos
Além da ECT, há outros tratamentos baseados na
estimulação cerebral, cuja eficácia ainda não está tão bem comprovada
quanto a da ECT (1):
- Terapia convulsiva magnética (TCM) - indução de atividade elétrica através da aplicação ao cérebro de campos magnéticos
- Terapia de crises focais por administração de eletricidade (TCFAE) - indução de crises através de uma administração de eletricidade em áreas menos extensas e mais bem delimitadas do cérebro, quando comparado à ECT
- Estimulação magnética transcraniana (EMT) - o cérebro é estimulado diretamente através de campos magnéticos localizados
- Estimulação cerebral através de corrente contínua - a estimulação ocorre através de uma corrente elétrica continua, ao contrário do que ocorre na ECT, onde se usa corrente alternada.
Além destas técnicas chamadas de não invasivas
(i.e., não ocorre estimulação direta do cérebro), há aquelas que atuam
diretamente sobre o tecido cerebral (1):
- Estimulação cortical epidural (ECE) - o cérebro é estimulado através da colocação de placas sobre áreas na região mais externa das meninges (membranas que recobrem o cérebro)
- Estimulação cerebral profunda (ECP) - eletrodos são aplicados em regiões mais profundas do cérebro.
- Estimulação do nervo vago (ENV) - a estimulação elétrica, proveniente de uma bateria, é aplicada sobre o nervo vago, um nervo que se origina dentro do crânio e se espalha por vários órgãos internos.
BIBLIOGRAFIA
1. Reti I (editor) (2015) Brain stimulation ? methodologies and intervention, Wiley and Sons, New Jersey (Kindle Edition).
2. Grözinger M, Smith ES, Conca A On the
significance of electroconvulsive therapy in the treatment of severe
mental diseases. Wien Klin Wochenschr. 2015 Apr;127(7-8):297-302.
doi: 10.1007/s00508-015-0749-z. Epub 2015 Mar 3.
3. Sackeim HA Autobiographical memory and
electroconvulsive therapy: do not throw out the baby J ECT. 2014
Sep;30(3):177-86. doi: 10.1097/YCT.0000000000000117.
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