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segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Como usar a ansiedade a seu favor

  • Tracy Dennis-Tiwary*
  • BBC Future

 


 A palavra "ansiedade" agora é onipresente e absorve significados, como uma ameba, englobando tudo, desde o pavor até uma antecipação agradável. Muitas vezes, seu simples uso coloca essas experiências em um foco negativo, transformando-as em ameaças com um toque de inquietação.

E existem os transtornos de ansiedade. Eles são os diagnósticos mais comuns de saúde mental - mais que a depressão e a dependência. Centenas de milhões de pessoas em todo o mundo serão diagnosticadas com algum transtorno de ansiedade ao longo da vida.

Para que serve a ansiedade?

Emoções negativas como a ansiedade têm má reputação há muito tempo. Ela é irracional, na melhor das hipóteses, destrutiva no pior dos casos

O Poeta da Roma antiga Horácio escreveu, há mais de 2 mil anos, que a "raiva é uma pequena loucura". Mas, ao longo dos últimos 150 anos, a partir do livro A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais, de Charles Darwin, passamos a realmente compreender que emoções como a raiva, o medo e a ansiedade são mais convenientes do que perigosas.

Como o polegar opositor e a linguagem, as emoções são ferramentas para nossa sobrevivência, forjadas e refinadas ao longo de centenas de milhares de anos de evolução para proteger os seres humanos e garantir o seu progresso. Elas agem fornecendo duas coisas: informações e preparação.

A ansiedade é a informação sobre a incerteza do futuro: algo de ruim pode acontecer, mas algo de bom, também.Mas a ansiedade não informa sobre certas ameaças presentes - quem faz isso é o medo. Quando você vê uma barbatana de tubarão erguendo-se da água a poucos metros de distância, enquanto está nadando, por exemplo. O medo primeiramente nos prepara para lutar, fugir ou congelar.

Já a ansiedade constrói a civilização. Ela nos prepara para persistir, permanecer vigilantes e agir de forma a evitar desastres futuros, podendo também transformar possibilidades positivas em realidade.

A ansiedade, por isso, é mais do que o "circuito elétrico do medo" no cérebro. A ansiedade também ativa nossa necessidade de recompensa e conexões sociais, impelindo-nos a trabalhar por aquilo de que cuidamos, a conectar-nos com os demais e a ser mais produtivos.Por isso, do ponto de vista da teoria da evolução, a ansiedade não é destrutiva. A ansiedade incorpora a lógica da sobrevivência.

Mas a teoria da evolução e as pesquisas não atingiram a consciência pública, nem a maioria dos profissionais médicos. Longe de tratar a ansiedade como uma possível aliada, nós a tratamos como um inimigo fazendo barulho no portão.

Os transtornos da ansiedade podem ser paralisantes, mas o uso disseminado do termo "ansiedade" para indicar um mal-estar em geral é problemático. Ele significa que nós aceitamos duas falácias fundamentais: (a) a experiência da ansiedade é perigosa e destrutiva; e (b) a solução para a sua dor é evitá-la ou erradicá-la.

Esta forma de pensar nos levou a perceber nossas ansiedades diárias como distúrbios a serem reparados. Mas somente os transtornos da ansiedade - quando a ansiedade extrema e nossas tentativas de lidar com ela interferem no nosso dia a dia - são reconhecidos como condições de saúde mental. Já a emoção da ansiedade deve ser considerada normal, saudável e até benéfica.

Ao contrário das doenças infecciosas ou do câncer, evitar e suprimir a ansiedade certamente a amplificará, trazendo simultaneamente um custo de oportunidade, evitando que procuremos formas produtivas de enfrentar e estabelecer técnicas de resiliência emocional.

Este é o círculo vicioso da ansiedade, que cresce até sair de controle: sentir que a ansiedade é perigosa, ter medo dela e, por fim, fugir dela, suprimindo-a e evitando-a.

Por que ela incomoda tanto?

A ansiedade precisa causar mal-estar para fazer o seu trabalho. A própria origem da palavra, derivada das palavras em latim e grego para engasgado, dolorosamente restrito e desconfortável, reflete essa sensação desagradável, que é essencial.

Somente algo tão desagradável pode nos compelir de forma consistente a parar e prestar atenção, exigindo efetivamente que trabalhemos mais para evitar perigos futuros e traçar um curso mais positivo. E, ainda assim, a maioria de nós aprendeu a evitar e ignorar essa emoção tão útil, para nosso prejuízo.

Pense na ansiedade como um alarme contra incêndios, avisando que a casa está pegando fogo e alertando para que você tome alguma providência. O que aconteceria se, em vez de sair de casa e chamar os bombeiros, você simplesmente ignorasse o alarme, retirasse a bateria do aparelho ou evitasse lugares da casa onde o alarme soa mais alto?

Em vez de se beneficiar do alarme, apagando o fogo e evitando incêndios futuros, você iria simplesmente esperar, rezando para que a casa não fosse destruída.

Mas, independentemente da causa, ouvir a nossa ansiedade - acreditando que exista sabedoria inerente no que ela tem a nos dizer e que podemos usá-la em nosso benefício - é a primeira etapa para aprendermos a ser ansiosos da forma correta. E esta mudança de mentalidade traz um impacto positivo poderoso.

A ansiedade como ferramenta

Um estudo da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, demonstrou que, quando pedimos a pessoas socialmente ansiosas uma tarefa realmente estressante - dar uma palestra pública em frente a um quadro de juízes sem tempo de preparação - mas também ensinamos a elas a pensar nas suas reações ansiosas como sinal de que estamos prontos para enfrentar um desafio (em vez de um sinal de angústia), elas apresentam melhor desempenho sob pressão.

As pessoas foram mais confiantes, menos ansiosas e apresentaram batimentos cardíacos mais estáveis e pressão sanguínea mais baixa quando estavam envolvidas e concentradas.

Interagir com a ansiedade, muitas vezes, é a chave da cura.

Existem pesquisas com veteranos de guerra que reduzem seu risco de desenvolver estresse pós-traumático quando prestam mais atenção às informações que provocam ansiedade, em vez de distrair-se delas.

Aprender a ser ansioso da forma certa significa encontrar formas de trabalhar a ansiedade, em vez de contorná-la - alavancar e canalizar a ansiedade para atingir objetivos e discernir quando a ansiedade não é útil e deixar que ela passe.

Pense neste círculo virtuoso da ansiedade como dividido em três partes: ouvir, alavancar e deixar que ela passe.

1. Ouvir

A ansiedade ajuda a ampliar a nossa concentração e motivação enquanto nos aproximamos do ponto onde queremos estar. É por isso que a ansiedade traz esperança. Podemos observar ameaças futuras, mas também temos os olhos voltados para o prêmio à nossa frente, acreditando que podemos trabalhar para transformar as boas perspectivas em realidade.

Mas, para que a ansiedade nos leve até lá, ela precisa ser desconfortável para podermos nos levantar, prestar atenção e ouvir o que ela está dizendo. Sentimentos terríveis, que não podem ser ignorados, também nos fazem querer nos afastar deles.

2. ALAVANCAR

Encontrar informações úteis na ansiedade nos prepara para canalizar e dirigir nossas energias para os objetivos e buscar propósitos. Dedicar tempo para pensar no nosso propósito melhora o ânimo e aumenta a concentração e o aprendizado. Esses benefícios podem durar meses ou até anos.

Quando canalizamos nossa ansiedade para buscar e priorizar nossos propósitos, ela se transforma em coragem. A ansiedade alimenta nossos impulsos e libera nossas forças.

3.Deixar passar

Mas a ansiedade nem sempre é útil ou direta. Às vezes, ela demora para revelar sua mensagem.

Em outras ocasiões, ela não tem sentido. A vida é mesmo desafiadora e existem muitas emoções, mas nenhuma informação útil. A ansiedade nos lança em um rodopio para o tempo futuro, preocupados e oprimidos. Qual a melhor forma de fazê-la passar?

Procure atividades relaxantes e que causem sua imersão no presente. Leia um poema favorito ou busque consolo na música. Ouça aquele novo podcast. Exercite-se ou faça uma caminhada tortuosa.

Ligue para o terapeuta ou para aquele amigo que sempre traz um ponto de vista útil. É nesses momentos que também construímos a consciência emocional e as técnicas para lidar com nossas emoções difíceis, sem nos afastarmos delas, e buscar apoio quando precisamos.

Ansiosos da forma certa

Nestes tempos de pandemia, polarização política e mudanças climáticas, muitos de nós certamente nos sentimos sobrecarregados pela ansiedade com o nosso futuro. Para lidar com isso, aprendemos a lidar com a ansiedade como fazemos com qualquer doença - queremos preveni-la, evitá-la e eliminá-la a todo custo.

Mas o fato é que, com isso, estamos andando para trás. O problema não é a ansiedade. A ansiedade é o mensageiro que nos conta que estamos enfrentando incertezas e precisamos lidar com as dificuldades; ou que nos mostra que a nossa vida precisa mudar ou estamos precisando de ajuda.

Na verdade, um dos principais problemas é que as nossas crenças sobre a ansiedade nos impedem de acreditar que podemos lidar com ela; que podemos ter acesso a estratégias de sobrevivência, aos tratamentos existentes e nos beneficiar deles; e que podemos aprender a usá-la em nosso benefício.

E, quando nossas crenças aumentam a ansiedade, temos maior risco de caminhar rumo à ansiedade debilitadora e seus transtornos.

O principal problema para alguém diagnosticado com um transtorno de ansiedade não é a intensa ansiedade que ele está sentindo, mas que as ferramentas à sua disposição para desligar esses sentimentos estão causando impedimento funcional. Elas impedem o autocuidado, o trabalho, a conexão com os demais e uma vida de realizações.

Todos nós nascemos ansiosos. A tarefa do ser humano é aprender que a ansiedade pode ser difícil e, às vezes, até aterrorizante. Mas podemos aprender a transformá-la em um aliado, um benefício e uma fonte de criatividade. Quando resgatarmos a ansiedade, resgataremos a nós mesmos.

*Tracy Dennis-Tiwary é autora do livro "Future Tense: Why Anxiety is Good for You (Even Though it Feels Bad" ("Tempo futuro: por que a ansiedade é boa para você (mesmo causando mal-estar)", em tradução livre), professora de psicologia e neurociências e diretora do Laboratório de Regulação das Emoções da Faculdade Hunter em Nova York, nos Estados Unidos.

FONTE: https://www.bbc.com/portuguese/geral-63815685

quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Entrevista com o Psicólogo Nazir Rachid Filho

 


Mestre em Políticas Públicas pela Universidade Estadual do Ceará - UECE. Possui especialização em Gestão de Empresas Públicas pela UTAD (Portugal), em Avaliação e Planejamento de Políticas Públicas pela Faculdade SEAMA e em Psicologia Clínica pela PUC-MG, graduado em Psicologia pela Universidade da Amazônia (UNAMA) e possui Licenciatura Plena em Psicologia pela UNESPA. Atualmente é psicólogo do Governo do Estado do Amapá, atuando no Centro de Reabilitação do Amapá - CREAP e professor de Psicologia em duas IES: Centro de Ensino Superior do Amapá - CEAP e Faculdade Meta. Além da docência, tem experiência em Psicologia nas áreas de Clínica, Saúde, Organizacional e Jurídica.

01 Porque a escolha pelo curso de Psicologia?

Costumo dizer que foi uma escolha intuitiva, meu ensino médio foi técnico na área de ciências exatas, pensei em continuar na área, mas percebi que gostava de atividades que envolvessem pessoas, que tivessem um cunho mais social, foi quando decidi fazer Psicologia

0     Como foi a sua experiência na Universidade de Psicologia?

A primeira grande surpresa foi quando descobri que muitos teóricos iniciais da Psicologia foram físicos (e para quem veio de CE, me senti em casa), mas de resto estranhava o fato de desconhecer muitos termos e rotinas, como forma de contornar essa dificuldade ia para a biblioteca da faculdade estudar os assuntos das aulas, em pouco tempo já tinha diminuído essa dificuldade e fui descobrindo novos conhecimentos dentro da Psicologia.

0. Você possui o Curso de Licenciatura Plena em Psicologia, conte um pouco sobre isso.

Em razão das minhas constantes idas a biblioteca para estudar fui me destacando no curso e com frequência alguns colegas vinham me pedir ajuda com algum assunto, essa experiência me fez gostar de falar, explicar e buscar formas diferentes de fazer as pessoas entenderem os assuntos, foi então que optei pela licenciatura, descobri que gostava de sala de aula.

04. Quais conexões você percebe entre o trabalho do Educador e do Psicólogo?

Muitas, nem todas as pessoas aprendem do mesmo jeito, nem ao mesmo tempo, aspectos da vida pessoal influenciam positiva e negativamente a aprendizagem, ao longo dos anos fui procurado diversas vezes por alunos que muitas vezes precisavam apenas de um pouco de atenção e perceber quanto esse simples gesto contribuiu para o aprendizado, para o crescimento e para o vínculo.

05.  Conte-nos um pouco sobre suas áreas de Especializações:

Sempre tive uma paixão pela clínica, Psicologia Clínica foi minha primeira escolha, mas sentia que a faculdade não atendia a todas as expectativas, assim que tive uma oportunidade fui em busca de uma qualificação. Uma outra dificuldade era que no Amapá não tínhamos esse tipo de oportunidade, era preciso buscar fora, mas não dava para deixar de trabalhar. Esse foi o maior desafio, razão pela qual acabei buscando uma qualificação mais viável no Estado que foi a área de Políticas Públicas, onde podia continuar explorando as questões da Psicologia em conjunto com as questões de governabilidade e acesso da população aos serviços prestados pelos profissionais psicólogos.

06. Como foram seus primeiros trabalhos relacionados à psicologia?

Comecei trabalhando com Adolescentes infratores no Estado do Pará, ao chegar em Macapá, trabalhei na área que mais me identifico, a saúde, comecei na época no Hospital Geral, hoje Hospital de Clínicas Dr. Alberto Lima, posteriormente fui convidado a trabalhar com a área Organizacional, trabalhei em uma grande empresa privada do comércio local, no mesmo período sai do Hospital e fui conhecer a área jurídica, trabalhando com a Policia Civil do Amapá, hoje de volta a saúde trabalho no Centro de Reabilitação do Estado com pacientes em recuperação de aspectos físicos e neurológicos, ao longo deste período sempre estive tanto na clínica, quanto na sala de aula, dividindo meu tempo e trabalhando bastante.

07.  Quais são os principais desafios do seu trabalho na clínica?

A atualização constante e a dificuldade do acesso a informação de qualidade e capacitação.

08. Quais são as principais alegrias e satisfações no seu trabalho? E quais são os pontos negativos?

A satisfação e o reconhecimento das pessoas é algo que me gratifica, gosto de saber que contribui de alguma forma para o crescimento, amadurecimento ou tranquilidade emocional de uma pessoa, outra coisa importante é o quanto a profissão auxiliou no meu crescimento pessoal. Em contrapartida os desafios são constantes e contínuos, o maior, na minha avaliação é o reconhecimento da Psicologia, ainda há uma aura de muito preconceito em torno do trabalho, esse é um obstáculo difícil de ser transposto.

09. Na sua opinião, porque a terapia ainda é vista com preconceito por algumas pessoas?

O desconhecimento do processo e as faltas crenças associada a ele contribuem para esse preconceito, apesar de hoje se usar muito a expressão saúde mental, muitos ainda associam com aspectos de doença ou transtorno mental, o que para muitos parece estar relacionado com a ideia ou fantasia de loucura, outra barreira existente é a dificuldade das pessoas em falar sobre suas próprias questões pessoais e emocionais, é um desafio a ser superado, espero que algum dia a psicoterapia seja vista com a mesma naturalidade como ir ao dentista ou a um fisioterapeuta.

 

 

quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Entrevista com a Psicóloga Leidiane de Souza Miranda

                                             Leidiane de Souza Miranda

   Psicóloga Clínica especialista em Neuropsicologia (Autismo e TDAH)

1) Entre tantas áreas de atuação dentro da psicologia, por que a opção pela área de Neuropsicologia?

 Porque é uma especialização mais bem aprofundada da psicologia em si. Envolve a avaliação das funções cerebrais e a causa de alguns comportamentos que estão "atrelados" a cognição.

 

 2)Quais são as diferenças entre o Psicólogo e o Neuropsicólogo?

O psicólogo trabalha em prol das emoções, situações-problemas, relações interpessoais e formas de ressignificar as situações estressantes. O neuropsicólogo buscar entender, através de testes neuropsicológicos a causa de alguns determinados comportamentos.

 

3)Você poderia falar sobre a sua experiência no tratamento de pacientes com Autismo?

A minha experiência nessa área está cada dia mais esplêndida, principalmente aqueles casos mais "sutis" de características. Estudar essa área tem sido um prazer enorme e sem contar em ajudar no diagnóstico de várias crianças/adultos.

 

4)Você poderia falar sobre a sua experiência no tratamento de pacientes com TDAH?

Essa experiência tem me apresentado vários sentimentos e realizações. No que diz respeito a intervenção e o diagnóstico. É muito prazeroso ajudar pessoas no diagnóstico.

 

5) Como é o mercado para quem quer iniciar o trabalho na sua área de atuação?

O mercado está cada dia mais concorrido, principalmente em termos de autismo e como psicoterapeuta. Buscar novas especializações ajuda a ampliar o leque de experiências.

 

6) Quais características ou habilidades são importantes que o Neuropsicólogo tenha?

O primeiro é entender um pouco sobre o comportamento humano e o segundo é estudar (livros e testes). Ter esses dois requisitos é fundamental para que o profissional seja reconhecido.

 

7) Quais os pontos positivos e negativos da sua área de atuação?

Pontos positivos: receber elogios dos pacientes/dos pais. Ver a evolução das pessoas na terapia. Ajudar o outro no autoconhecimento. Ajudar na resolução de problemas. Identificar as características de autismo e TDAH. Estudar cada caso. Aprender os casos de cada paciente. E o mais importante, ganhar experiência e aprendizado com tudo isso.

Pontos negativos: ter casos difíceis. Sentir impotente diante de alguns casos mais complexos. Perceber que o paciente não põe em prática o que aprende na terapia (o que são poucos). Em termos de diagnóstico, os pais não contribuem com todas as informações necessárias (principalmente quando estou em dúvidas).

 

8)Na sua opinião quando uma pessoa deve procurar a ajuda de um psicólogo?

Quando ela identificar que os sofrimentos emocionais e psicológicos estão mais frequentes. Ou seja, reconhecer que precisa de ajuda. Ir ao psicólogo, não necessariamente, irá descobrir algum diagnóstico. É mais autoconhecimento e aprendizado. Fazer terapia é uma necessidade.

 

 

 

terça-feira, 20 de setembro de 2022

Entrevista com a Pedagoga Kelly Suane Furtado da Silva

 

Pedagoga Kelly Suane Furtado da Silva, formada pela Universidade Federal do Amapá e especialista em Estatística com Ênfase em Educação, funcionária do Estado desde 2006. Atuou 12 anos na coordenação pedagógica do Colégio Amapaense e, desde 2018, desenvolve suas funções no Centro de Educação Profissional Graziela Reis de Souza.

 

01.Como você chegou a essa carreira? O que te motiva? Por que você a escolheu?

Desde criança, sempre quis ser professora. Primeiro queria ser professora de Matemática, depois de Língua Portuguesa, mas acabei me formando em Pedagogia e me enveredei para a função de Coordenadora Pedagógica, na qual atuo há mais de 16 anos.

 

02. Quais pontos mudaram entre a sua experiência na Universidade e a realidade que você vivencia na realidade de trabalho?

Tudo, na prática, é diferente da experiência que vivemos na Universidade. O conhecimento sistematizado é essencial, mas é a vivencia do dia a dia que nos mostra a vontade de continuar, ou não, na função. Foi muito importante trabalhar por longos anos na Educação Básica, coordenando o Ensino Médio. Mas também já trabalhei no seguimento da Educação Infantil. Hoje, vivo a experiência de coordenar cursos técnicos profissionalizantes e tudo isso me faz sentir realizada.

 

03.Quais são as dificuldades que você vivencia na sua profissão? Quais são os pontos positivos?

Hoje em dia, trabalhando na Educação Profissional, a principal dificuldade que vivencio é a falta de políticas públicas voltadas para este seguimento. Muitas vezes, não temos as orientações técnicas que precisamos. Por outro lado, é gratificante acompanhar, orientar e coordenar todo o processo de formação dos alunos dos cursos profissionalizantes. A maioria está em busca de uma formação técnica para ser inserida no mercado de trabalho e garantir ou auxiliar no sustento de suas famílias.

 04.Qual o maior desafio que você enfrentou na educação durante a pandemia? Fale sobre as competências que você precisou desenvolver para conseguir se adaptar ao novo modelo de ensino.

Durante a pandemia, todos passamos por dificuldades das mais diversas. No meu caso, enquanto Coordenadora Pedagógica, a maior foi acompanhar e orientar os alunos indígenas do Curso Técnico em Enfermagem, durante as aulas on-line, especialmente àqueles que precisaram retornar para as suas comunidades durante este período, pois, além da dificuldade de acesso à internet, a maioria não tinha conhecimento, muito menos domínio sobre as ferramentas e plataformas utilizadas para as aulas remotas. Foi um grande desafio inclusive para mim, pois também precisei aprender a manuseá-las. Outro grande desafio foi lidar com o medo, a insegurança, o isolamento e a ansiedade dos alunos. Muitos quiseram desistir.

05. Devido à Pandemia, notamos que houve um aumento substancial no número de alunos com depressão e transtorno de ansiedade. Como você enfrentou e enfrenta essa situação em seu ambiente de trabalho e na sua vida pessoal? 

Foi e ainda é preciso ter muita sensibilidade e empatia. Muitos alunos e colegas de trabalho perderam familiares para a covid-19 e ainda sofrem as consequências desta irreparável perda. Por isso, considero importante respeitar o tempo que cada um precisa para se recuperar, mas é necessário estar atenta aos “sinais” de possível depressão e transtorno de ansiedade que os alunos, colegas de trabalho e as pessoas do meio familiar demonstram para poder ajuda-los e estimulá-los a procurar um profissional da área da Psicologia.

 

06. Em virtude do setembro amarelo, enquanto profissional e pessoa, qual é a sua opinião sobre este mês de combate à depressão e o suicídio? 

A depressão e o suicídio são transtornos que devem ser tratados como problema de saúde pública. O mês de setembro é muito importante por ser um período dedicado às realizações de diversas campanhas voltadas ao combate e prevenção destes transtornos. É preciso ampliar as discussões sobre esses temas para que sejam criadas mais políticas públicas voltadas para essa problemática, para que deixem de ser um “tabu” e as pessoas sejam sensíveis àquelas que apresentem sintomas e que estas se sintam seguras em procurar ajuda, seja de um profissional, um familiar ou qualquer pessoa que lhe desperte confiança.

 

07.Estamos vivenciando uma nova era “pós-pandemia”, quais são os desafios vivenciados pelo Centro Graziela Reis de Souza na formação de novos profissionais?

Essa nova era “pós-pandemia” exige de todos os envolvidos no processo de formação e de ensino-aprendizagem uma maior competência sócioemocional. Formar profissionais seguros, éticos, pacientes, autônomos, responsáveis e criativos é o desafio, depois de tantas perdas causadas pela pandemia da Covid-19.

 

08.Na sua opinião, quais estratégias devemos desenvolver para melhorar a Saúde Mental dos nossos alunos? 

Primeiramente, a principal estratégia para melhorar a saúde mental dos nossos alunos é estimulá-los a falar. Fazer com que eles percam o medo de falar sobre o que lhes atormenta é o primeiro passo a ser dado. Portanto, é muito importante que a escola seja palco de discussões amplas sobre depressão, suicídio, ansiedade e outros transtornos psicológicos que angustiam nossos jovens, e que essas discussões sejam conduzidas por profissionais, como psicólogos, terapeutas, pedagogos, professores, etc., que possam trazer as orientações técnicas que os alunos necessitam. Por acreditar nesta estratégia, nós, professores do Centro de Ensino Graziela Reis de Souza demos início ao nosso Projeto Setembro Amarelo, cujo tema deste ano é “Como vai você? Falar é a melhor solução; ouvir é ter empatia”, com o objetivo de conscientizar a comunidade escolar sobre a prevenção e combate ao suicídio. Para isso, oportunizamos um dia inteirinho só com palestras voltadas para a temática, seguido de uma Escuta Psicológica, onde psicólogos poderão escutar, acolher, orientar e encaminhar para psicoterapia os casos necessários.